História

A bacia do Rio das Velhas guarda histórias em suas margens, cidades e em seus moradores. Uma história em constante construção e mudanças que desvendam a região que faz parte do núcleo formador do estado de Minas Gerais e onde a cultura regional sobreviveu ao passar dos anos.

A história da ocupação humana na bacia do Rio das Velhas remonta há cerca de 12 mil anos, época em que os primeiros habitantes usavam as grutas existentes na região do Médio Rio das Velhas como abrigo. O mais antigo fóssil humano já encontrado nas Américas foi desenterrado a poucos quilômetros das margens do Rio das Velhas. Era o fóssil de uma mulher de 1,50 metros de altura e com cerca de 20 anos de idade. Ganhou o nome de Luzia pelos arqueólogos que a estudaram.

Sem residência fixa, Luzia perambulava pela região onde hoje está o Aeroporto Internacional de Confins, nos arredores de Belo Horizonte, acompanhada de uma dúzia de parentes. Vivia do que a natureza da região lhe oferecia se contentando com coquinhos de palmeira, tubérculos e folhagens. Em ocasiões especiais, dividia com seus companheiros um pedaço de carne de algum animal que conseguiam caçar. Eram tempos difíceis aqueles. Luzia morreu jovem, provavelmente vítima de um acidente, ou do ataque de um animal, sem ao menos ter direito aos rituais de sepultamento de seu povo. O corpo ficou jogado numa caverna, durante 11.500 anos. Essa população não perdurou por muito tempo na região.

São diversos os vestígios e achados arqueológicos encontrados em Lagoas Santa que chamaram a atenção do mundo para a bacia do Rio das Velhas. Assim, a região ganhou importância internacional na área da arqueologia e paleontologia, tendo os primeiros estudos datados no século XIX, quando foi objeto de estudo do naturalista Peter Wilhelm Lund.

Foto do Crânio de Luzia e Lapa Vermelha

O Ciclo do Ouro

Ao aportarem no Brasil, em 1500, os portugueses não imaginavam a imensidão de riquezas que a terra recém-avistada escondia sob a exuberante paisagem. A Coroa portuguesa, durante as Grandes Navegações (XV-XVI), tinha como principais objetivos a expansão comercial e a busca de produtos para comercializar na Europa.

Entretanto, quando chegaram, as terras brasileiras já eram ocupadas pelos povos indígenas. Ao procurar por prata e esmeraldas no Brasil, os portugueses acabaram encontrando ouro e diamantes. Uma época denominada de Ciclo do Ouro que tem grande relevância histórica tanto para o Rio das Velhas quanto para o desenvolvimento de Minas Gerais.

Os bandeirantes − os homens que participavam das bandeiras e entradas − eram principalmente paulistas, que, entre os séculos XVI e XVII atuaram na captura de escravos fugitivos, destruição de quilombos, aprisionamento de indígenas, mapeamento de territórios em busca de pedras e metais preciosos.

A primeira pepita foi achada em 1677, no Rio das Velhas, entre as cidades de Sabará e Lagoa Santa. A descoberta é creditada a Manoel Borba Gato e Garcia Rodrigues Paes Leme, remanescentes da bandeira de Fernão Dias, de quem eram genro e filho, respectivamente.

Nesta época, Fernão Dias se estabeleceu na região que, posteriormente, ficou conhecida como Pedro Leopoldo. A casa e a capela construídas ali deram início ao arraial chamado Quintas do Sumidouro. O nome se deve à existência de um rochedo de calcário de aproximadamente 20 metros de altura em cuja base desaparece o Córrego Samambaia, volumoso ribeirão que corta a região e que é afluente do Rio das Velhas. Ainda hoje, encontra-se no local a Casa de Fernão Dias e a Capela Nossa Senhora do Rosário, remanescentes desse período de intensas descobertas.

Canoa em Quinta do Sumidouro

Foram os bandeirantes que fundaram as primeiras cidades de Minas Gerais, todas próximas ao Rio das Velhas: Ouro Preto, na sua nascente, e a poucos quilômetros, na bacia do Rio Doce, a cidade de Mariana. Em seguida foram criados Sabará, Caeté e Santa Luzia. Diamantina, fundada nos anos 1700, também tem parte do seu território na bacia.

O Rio das Velhas e toda a sua bacia sofreram muito nesta época com o garimpo, o que ocasionou o desmatamento, inclusive das matas ciliares, e posteriormente com a exploração das montanhas regionais, ricas em minério de ferro.

Outros viajantes

Pelo Rio das Velhas também passaram, ao longo dos séculos, cientistas e viajantes naturalistas, que o descreveram detalhadamente em seus relatos. Os desbravadores deixaram um legado imenso, em forma de livros, mapas, descobertas botânicas, zoológicas, etnográficas e, principalmente, relatos pessoais que narram a vida no Rio das Velhas 200 anos atrás.

Pintura de Sabará, por Rugendas

O geólogo alemão Barão de Eschwege veio aos Brasil em 1810, a convite do príncipe regente D. João VI para reanimar a decadente mineração de ouro e trabalhar na nascente indústria siderúrgica. Ele estudou e escreveu a respeito da mineralogia brasileira e descreveu o caminho que liga Sabará a Diamantina. Acredita-se que foi o Barão de Eschwege quem deu nome à Serra do Espinhaço, ao associar as suas formas à de uma coluna vertebral.

O naturalista francês Auguste de Saint-Hilaire percorreu parte do Brasil entre 1816 e 1822. Ele conheceu o Caminho dos Currais do Rio das Velhas e relatou em sua obra o Caminho do Mato Dentro, hoje conhecido como Estrada Real que passava pela parte leste da Serra do Espinhaço.

Os alemães Spix e Martius percorreram parte do Brasil entre 1817 e 1820. Os dois cientistas passaram pelos caminhos antigos que foram trilhados ao longo do Rio das Velhas e descreveram o trajeto que ligava Ouro Preto a Sabará, tendo chegado até Diamantina. A cavalo e em lombo de burro, os dois naturalistas levaram 15 dias para percorrer os cerca de 400 quilômetros que separam as duas cidades.

O Barão de Langsdorf navegou pelo Velhas em 1824 até Jequitibá e depois tomou o caminho terrestre para o interior dos morros de Minas. Langsdorff deixou vários registros sobre o Brasil. Dentre os mais interessantes, encontra-se o quadro pintado por Rugendas, que era desenhista de sua expedição, intitulado “Sabará e o Rio das Velhas”, no qual a Vila Real de Sabará é representada com grande destaque para o Velhas, imponente na região.

O lendário aventureiro Richard Burton navegou, em 1867, o trecho do Rio das Velhas que vai de Sabará ao São Francisco. Nesta viagem, conheceu uma paisagem peculiar e instigante, mesmo para ele, que já tinha atravessado lugares exóticos e deslumbrantes ao redor do mundo. Durante a expedição fez registros minimamente detalhados que discorriam sobre características da vegetação, da hidrografia e do relevo, além de observar atentamente os traços culturais da população que habitava a região e denotavam sua curiosidade e admiração por essas terras.

 

Era impossível contemplar sem entusiasmo o encontro dos dois poderosos cursos de água. (…) Se algum lugar merece o selo de grandeza conferido pela mão da Natureza é essa confluência.”

Trecho registrado no diário do desbravador inglês, Richard Burton, quando presenciou o encontro dos Rios das Velhas e São Francisco, em 1867.

 

Cientista dinamarquês, o naturalista Peter Lund veio ao Brasil em 1925. Ele é considerado o pai da paleontologia brasileira, o ramo da ciência que estuda as formas de vida existentes em períodos geológicos passados, a partir dos seus fósseis. O pesquisador descobriu mais de 12 mil peças fósseis em cavernas da região de Lagoa Santa que permitiram escrever a história do período pleistocênico brasileiro, o mais recente na escala geológica.

Origem do nome

O nome Rio das Velhas tem origem indígena (tupi-guarani). Antes de receber essa nomeação, era conhecido como rio Uaimií pelos indígenas. A antiga pronúncia foi traduzida na forma portuguesa Guaxim, da qual nasceu Guaicuy que significa Rio das Velhas Tribos Descendentes.

A Revista do Velhas número 13 tem uma matéria sobre a origem do nome: Avó Água.

 


Situação atual

A bacia do Rio das Velhas começou a sofrer na época do Ciclo do Ouro com a poluição originada nos centros urbanos que utilizam os cursos d’água como destino para todo o tipo de esgoto e lixo, situação que foi agravada com o passar dos anos.

Por drenar a região mais industrializada e densamente povoada de Minas Gerais, a Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), a bacia do Rio das Velhas vem sofrendo acelerado e crescente processo de degradação. Entre os principais impactos podemos citar:

  • A atividade mineradora nas cabeceiras da bacia, que altera a cor da água e faz elevar os teores de sólidos em suspensão;
  • A poluição pelo despejo de esgotos doméstico e industrial não tratados de grande parte da região metropolitana de Belo Horizonte, com nítidos efeitos na qualidade da água do rio;
  • O desmatamento da vegetação ciliar que protege o rio contra o assoreamento e funciona como um filtro de produtos tóxicos (fertilizantes, pesticidas, agrotóxicos, entre outros);
  • A construção de barragens para aproveitamento hidrelétrico e acumulação de água para consumo humano, verificada nas cabeceiras e em afluentes do rio das Velhas;
  • A introdução de espécies exóticas, provenientes de outros países ou de outras bacias brasileiras;
  • A retirada indiscriminada de água para projetos de irrigação e o aterro de veredas, várzeas, áreas alagáveis e lagoas marginas, importantes locais de desova e procriação para as espécies de peixes.

Em virtude disso e para alcançar a disponibilidade de água em quantidade e qualidade, visando garantir os múltiplos usos e a segurança hídrica, a bacia do Rio das Velhas necessita de revitalização.

A bacia hidrográfica do Rio das Velhas possui um Comitê de Bacia para propor e ajudar a decidir sobre as políticas e ações a serem implementadas nos rios que a compõe. O objetivo do CBH Rio das Velhas é estabelecer metas sejam qualitativas ou quantitativas em consenso com os usuários de água, poder público e população da bacia), a serem atingidas pela execução dos chamados Planos de Bacia, nestes incluídos prazos, custos e fontes de recurso. O Comitê faz parte da Política Nacional de Recursos Hídricos do Brasil, implementada com a Lei Nº 9.433 de 1997.