Mudanças climáticas tornam enchentes mais extremas na bacia do Rio Maracujá

03/11/2021 - 19:17

Após o temporal que causou uma perigosa enchente no Rio Maracujá em meados de outubro, deixando mais de cem pessoas desabrigadas, um alerta acendeu na população local. Quais as soluções viáveis para evitar as inundações na região? Embora as enchentes ocorram há anos na bacia do Maracujá, pesquisadores garantem que as mudanças climáticas conseguiram agravar ainda mais a situação.

Morador de Cachoeira do Campo, o diretor-geral do Instituto Federal de Minas Gerais (IFMG) de Ouro Preto, o professor Reginato Fernandes, testemunhou a tragédia ilhado dentro de casa no dia do temporal. Ele conta que o problema não pertence apenas a Amarantina e Cachoeira do Campo e propôs um estudo sobre os rastros da enxurrada para recomendar soluções para a região. “O problema se inicia nas cabeceiras, em outros distritos que são regiões mais elevadas que Cachoeira do Campo e Amarantina. O alto índice de chuva – que em um período de uma hora foi de 130 a 170 milímetros – desceu a cabeceira, culminou no rio Maracujá e chegou aos dois distritos com áreas mais planas, conhecidas como várzea”, explicou Reginato Fernandes.



Um estudo publicado em outubro deste ano na revista Climate Resilience and Sustainability indica que as fortes chuvas que tem provocado alagamentos em Minas Gerais têm mais de 40% de relação com as mudanças climáticas no planeta. A atividade humana é a principal culpada pelo clima extremo que estamos começando a experimentar, segundo um relatório climático da Organização das Nações Unidas (ONU) divulgado em agosto deste ano. Como se sabe, ao queimar combustíveis fósseis, os humanos liberam gases de efeito estufa que aquecem o planeta, influenciando o ciclo da água.

No caso da bacia do Rio Maracujá há também outros impactos que favorecem as enchentes. O curso d’água sofre de intenso assoreamento em sua cabeceira causado principalmente pela mineração de topázio imperial, com a presença de muitas voçorocas, algumas delas as maiores do país.

Há também a retificação que causa um aumento da velocidade de fluxo das águas represando o sedimento em sua calha. Além disso, com a redução da área de infiltração das águas pluviais devido às construções, pavimentação de vias públicas, as águas do escoamento superficial vêm numa crescente velocidade de fluxo, com um volume de sedimentos aumentado, tendo como consequência a inundação de toda área em suas margens e entorno.

Veja as fotos do ribeirão Maracujá, em Cachoeira do campo, em março de 2021

Revitalizar e preservar são as soluções

 É justamente na região das cabeceiras do Alto Maracujá onde a degradação ambiental começa e impacta toda bacia. Os riscos apresentados apontam para a recuperação e revitalização urgente de todo este ecossistema.

Para o engenheiro geólogo, Edézio Teixeira de Carvalho, a primeira providência para evitar enchentes como as que ocorreram recentemente é desassorear todos os cursos d’água a montante, principalmente o reservatório da Pequena Central Hidrelétrica (PCH) Rio de Pedras, localizada em Itabirito, cuja exploração pertencente à Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig). “Os sedimentos que se encontram em Rio de Pedras devem ser retirados e alocados nas voçorocas que se encontram na bacia do Rio Maracujá. Estamos esquecendo que é o solo e não a chuva pesada que absorve e guarda a água. A geologia minimamente bem aplicada pensa em proteger os solos das alturas e em devolver o solo do assoreamento dos rios. É uma solução viável, mas com certeza onerosa e por isso até hoje não foi colocada em prática”, esclareceu o geólogo Edézio Teixeira de Carvalho.

Edézio Teixeira

Os sedimentos que descem pelo Rio Maracujá ficam em grande parte depositados na represa Rio de Pedras e que se encontra em grande parte assoreado. As consequências de um reservatório assoreado são a perda de água para geração de energia, desgaste das turbinas, impossibilidade de controlar inundações rio abaixo e ictiofauna dizimada.

Pesquisadores também apontam que na região das cabeceiras do Alto Maracujá deve ser criada uma Unidade de Conservação (UC) como uma das soluções para mitigação dos impactos e preservação daquela área.  As UCs tem sido usada mundialmente como forma de restabelecimento da biodiversidade. No Brasil, elas são normatizadas pela Lei n.º 9.985, de 18 de julho de 2000, que institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC).

 



Pensado na revitalização e preservação da bacia do Rio Maracujá, o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas (CBH Rio das Velhas), por meio do Subcomitê Nascentes, elaborou um Manifesto a ser enviado aos gestores públicos. Ronald Guerra, conselheiro do CBH Rio das Velhas e morador da região explica que há anos o Comitê explicita todos os processos de degradação da bacia do Rio Maracujá e sua dinâmica hidrológica para que sejam realizadas ações que resolvam ou que minimizem o problema.

Temos presenciado ocorrer justamente o oposto de tudo aquilo que estudamos, que nos apropriamos e que entendemos ser prejudiciais para o ambiente local: a ocupação das margens de inundação, incentivadas pelo poder público e/ou com sua conivência, grandes terraplanagens no território, construção de conjuntos de prédios, loteamentos e a expansão da mineração no entorno. O resultado é a redução da calha do rio, que amplia a velocidade das águas. O manifesto visa sensibilizar e alerta a população sobre a situação da bacia, bem como cobrar dos gestores políticas pública que revertam a degradação do Maracujá”, disse Ronald Guerra.

A bacia do Maracujá necessita de políticas de controle e fiscalização e um programa efetivo de revitalização em toda a sua cabeceira. “Temos muito a fazer pela frente para quebrar a inércia social e política em que nos encontramos e, assim,  cuidarmos melhor das águas e de seus caminhos”, finalizou Ronald Guerra.

 


Assessoria de Comunicação CBH Rio das Velhas:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
Texto: Luiza Baggio
Fotos: Léo Boi