A Associação dos Municípios Mineradores do Estado de Minas Gerais e do Brasil (AMIG) denuncia o risco de uma nova tragédia com o corte no orçamento da Agência Nacional de Mineração (ANM), responsável pela fiscalização de barragens. O corte de 9% no orçamento da ANM além de ferir a nova Lei dos Royalties do Minério de 2017 — por admitir contingenciamento dos 7% de CFEM (Compensação Financeira pela Exploração Mineral) que deveriam ser destinados à ANM–, coloca em risco a vida de milhares de pessoas que ficam sujeitas aos riscos da mineração sem fiscalização por inviabilizar a atuação da Agência.
Em 2019, foram arrecadados R$ 4,5 bilhões. A agência deveria ter recebido R$ 315,2 milhões, mas foram previstos R$ 67 milhões. Segundo os municípios mineradores, este número chegou a saltar para R$ 76 milhões este ano, mas ainda muito abaixo do determinado na criação do órgão. Em 2021, este montante deve cair para R$ 61 milhões, segundo a Lei Orçamentária Anual (LOA).
Atualmente, a ANM tem quatro fiscais para vistoriar cerca de 360 barragens em Minas Gerais, sendo que quatro delas estão em risco iminente de rompimento. Outros dois estão afastados por serem grupo de risco para Covid-19. Em 2021, este número pode chegar a zero, caso o orçamento previsto na LOA para o órgão seja aprovado.
De acordo com o consultor de Relações Institucionais da AMIG, Waldir Salvador, essa atitude do governo federal representa mais um corte grave em um orçamento que já era muito magro para a ANM. “Desse jeito, a agência praticamente não vai existir a partir do próximo ano. O governo está propiciando os maiores e os piores riscos ao país, porque não tem dado a devida importância ao tema. Em caso de uma tragédia, as cidades mineradoras serão muito prejudicadas, porque, ao lado das vítimas, sofrem diretamente os impactos da omissão do governo federal. A administração pública não é como a iniciativa privada, que consegue se reerguer rapidamente e retomar seu valor de mercado depois de uma avalanche de lama”, alertou.
No dia 31 de agosto, a AMIG chegou a encaminhar um ofício à presidência da República, aos ministérios de Minas e Energia e da Fazenda, à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal, pedindo para que o orçamento fosse revisto. A Associação sugere que o valor repassado deve ser de R$ 155,9 milhões.
A AMIG alerta que a redução do orçamento e a forma como a equipe econômica estipulou que ele seja gasto podem inviabilizar as atividades da ANM no ano que vem. “Em vez de alocar mais verbas para a fiscalização de barragens, o governo quer que a Agência use o orçamento reduzido para cumprir as obrigações firmadas junto ao MPF. Distribuímos 200 cópias deste ofício em Brasília e ninguém nos respondeu. O prejuízo social, econômico e político provocado por estas tragédias é incalculável para as cidades”, esclareceu Waldir.
O medo dos prefeitos é que tragédias como a de Mariana, ocorrida em 2015, quando 19 pessoas morreram e rios foram contaminados após rompimento da barragem da Samarco, e a de Brumadinho, em 2019, onde a estrutura da Vale entrou em colapso deixando 270 vítimas, voltem a acontecer.
O Ministério Público intimou, no mês de agosto, a União e a ANA para se manifestarem quanto à questão da redução no orçamento. No entanto, até o momento não houve retorno.
Barragens em risco
Em 20 meses, após a tragédia do rompimento da barragem da Vale em Brumadinho, o número de estruturas em Minas Gerais que elevaram seu nível de segurança passou de zero para 45, de acordo com a Defesa Civil.
Trinta e quatro estruturas estão em nível 1, que não requer a retirada de moradores das áreas de risco e nem o toque de sirenes. Ele significa estado de prontidão, indicando situação adversa na estrutura e controlável pela empresa. Outras sete estão em nível 2 com planos de evacuação em prática.
Quatro seguem em nível 3 com risco iminente de rompimento. Trata-se da B3/B4, no distrito de Macacos, em Nova Lima, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, Forquilhas I e III, em Ouro Preto, e a Sul Superior, em Barão de Cocais, na Região de Central de Minas Gerais.
Para o secretário do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas (CBH Rio das Velhas), Marcus Vinícius Polignano, não existe lei sem fiscalização. “A fiscalização é um pilar para a prevenção e tem a finalidade de proteger a sociedade. É ela quem verifica se as condições em que as mineradoras operam estão de acordo com o que foi estabelecido pela legislação vigente. Sem a fiscalização teremos o caos. Os casos de rompimento em Mariana e Brumadinho são históricos e nos mostram como uma fiscalização deficiente traz resultados trágicos. O próximo não poderá ser chamado de acidente”.
*Fonte: CBH Rio São Francisco