A Agência de Desenvolvimento da Região Metropolitana de Belo Horizonte (Agência RMBH) apresentou, na quinta-feira passada (26), em videoconferência, projeto de elaboração do Plano de Segurança Hídrica (PSH) abrangendo um total de 48 municípios: os 34 da RMBH e os outros 14 que compõem o chamado Colar Metropolitano.
Segundo o documento de convocação do evento, o processo, em parceria com o Instituto Mineiro de Gestão das Águas (IGAM), visa “contemplar iniciativas prementes em relação à segurança hídrica metropolitana” e ressalta que a “crise hídrica, vivida por diversas regiões brasileiras, associada ao contexto de rompimento das Barragens B-I, B-IV e B-IVA do Córrego do Feijão, no município de Brumadinho, tornou ainda mais aguda a necessidade de manejo de medidas de planejamento para a garantia de recursos hídricos de qualidade e de resiliência em caso de eventos extremos”.
O lançamento, comandado pela diretora-geral da Agência, Mila Batista da Costa, contou com as Secretárias de Estado Marília Carvalho (Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável) e Luísa Barreto (Planejamento e Gestão), a secretária substituta Vanice Ferreira (Infraestrutura e Desenvolvimento) e o diretor-geral do IGAM Marcelo da Fonseca. Além das autoridades estaduais, participaram conselheiros do Comitê de Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas (CBH Rio das Velhas), representantes de diversos municípios da região, do Ministério Público e da Agência Nacional das Águas (ANA), integrantes de ONGs e especialistas da área ambiental.
Para Marília Carvalho, a “solução para o abastecimento foi afetada pelo desastre de Brumadinho e aí percebemos a necessidade de planejar o futuro”. Luísa Barreto expressou “alegria por estarmos iniciando os trabalhos do PSH”. O diretor do IGAM aproveitou para informar que “acaba de ser feita a contratação do PSH estadual”.
O processo de formulação do PSH, que levará em consideração as bacias dos rios das Velhas, Paraopeba e Pará, deve durar 18 meses, com entrega do produto em agosto de 2023, e tem quatro macro-objetivos: subsidiar a gestão dos recursos hídricos na RMBH; definir áreas prioritárias com vistas à segurança hídrica e estabelecer a urgência da implementação de ações; propor um banco de projetos de ações estruturantes e não estruturantes de conservação/restauração, produção sustentável e uso racional da água, saneamento e controle da poluição, garantindo a quantidade e a qualidade do abastecimento de água da RMBH e, por fim, propor um Plano de Comunicação, Mobilização e Educação Ambiental para difundir informações e ampliar o conhecimento sobre o tema.
De acordo com a Agência RMBH, a “interação com os municípios, entidades, sociedade civil, instituições e demais atores que fazem a gestão dos recursos hídricos ou atuam em temas correlatos na RMBH permitirá que seja alcançada a escala desejada para o encaminhamento de soluções destinadas à melhoria da segurança hídrica em nossa metrópole”.
Membros do CBH Rio das Velhas marcaram presença na reunião, que também contou com membros do poder público e de outras entidades da sociedade civil
Dúvidas pelo caminho
Após apresentação do passo a passo do PSH, Carlos Bortoli, diretor da Profill Engenharia, contratada para desenvolver o projeto, abriu a palavra aos participantes.
Júlio Grillo, ex-superintendente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) em Minas, questionou se os impactos dos rebaixamentos de lençóis freáticos sobre a disponibilidade hídrica futura serão analisados, ao que Bortoli garantiu que “onde há pressão sobre os aquíferos, o estudo estará muito presente”, mas não pôde “dimensionar a profundidade do estudo essa área”.
Grillo ainda perguntou se “os impactos detectados pela Missão Grace (iniciativa da NASA e sua equivalente alemã DLR de monitoramento, por satélites, da quantidade de água disponível no planeta), serão levados em consideração, mas a questão ficou sem resposta.
Em entrevista ao CBH Rio das Velhas, o ex-superintendente acrescentou: “É fundamental que o PSH seja feito e bem feito, mas acho que estamos atrasados. Já devíamos ter feito isso desde 2014, quando tivemos o primeiro problema real de abastecimento aqui na Região Metropolitana”. Ele ainda confessou um receio do “ponto de vista da política”: “Hoje a Secretaria Estadual de Meio Ambiente praticamente se recusa a analisar os projetos com o seu impacto total. Eles fragmentam os processos, permitindo diversas aprovações sucessivas. Se permitem sucessivos rebaixamentos do lençol freático, sem analisar as consequências, não sei se adianta fazer um plano de segurança hídrica pra RMBH, porque vai acabar afetando todas as captações”.
Thiago Henriques Fontenelle, da ANA, quis saber se haverá “abordagem específica para integração dos comitês de bacia ao processo e pactuação de ações comuns”. Bortoli informou que o “planejamento dos Comitês de Bacia será levado em conta e que a discussão de áreas prioritárias será feita por critério hidrográfico” e asseverou: “Estamos atentos aos Comitês”.
André Matos, da Prefeitura de Sarzedo, ressaltou que “é importantíssimo tratar das questões mais que urgentes em relação aos conflitos entre mineração e conservação/produção de água”. Isaías Abreu, de Igarapé, disse que “falta apoio e que é preciso olhar para os municípios”.
Nova mentalidade
Para José Procópio de Castro, membro da Diretoria Ampliada do CBH Rio das Velhas e presidente do Instituto Guaicuy, “a grande preocupação é que o processo do PSH não sobreponha atribuições dos Comitês de Bacia, cada vez mais colocados de lado”. Procópio espera “que esse programa consiga fazer uma articulação transterritorial das bacias do Velhas, Paraopeba e Pará e que venha para fortalecer os Comitês como produtores de água”.
Outro conselheiro do CBH Rio das Velhas que acompanhou o lançamento do PSH foi Eric Machado, Superintendente de Fiscalização Ambiental da Prefeitura de Contagem. Com a experiência de quem também integra o GT de Barragens do Comitê, se inquieta: “Quando estamos discutindo situações como a insegurança hídrica gerada por grandes empreendimentos que têm degradado mananciais, nascentes, os recursos hídricos da RMBH, como o caso da Serra do Curral, vem um choque de imagem, de comunicação, tentando mostrar que o estado tem um programa que busca a segurança”.
Nísio Miranda, ex-conselheiro do CBH Rio das Velhas, reputa como “extremamente importante e urgente a implementação de um Plano de Segurança Hídrica para a RMBH, especialmente por sua localização, um território continuamente vitimado pelas investidas da mineração predatória, que impacta brutalmente nosso patrimônio hídrico, tanto pelo rebaixamento dos lençóis freáticos, quanto pelo uso abusivo da água de altíssima qualidade no transporte do minério extraído, dentre outras agressões às áreas de recarga e acumulação de água”. Miranda reputa como “imprescindível a ampla participação social, das organizações ambientalistas, dos gestores ambientais dos municípios que compõem a RMBH, dos Comitês e Subcomitês de Bacias Hidrográficas, detentores de grande conhecimento e inumeráveis informações sobre o território metropolitano”.
Num clamor pela vida, Procópio lembra que “o recurso que vai financiar o PSH advém do desastre de Córrego do Feijão, e o número de mortes e a insegurança hídrica da RMBH daí advinda obrigam esse plano a ser construído com grau de excelência, em memória às vítimas, criando uma nova mentalidade no trato das bacias hidrográficas”.
Assessoria de Comunicação do CBH Rio das Velhas:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
Texto: Paulo Barcala
Fotos: Leo Boi