CTOC recebe processo de outorga de 2015 e decide agendar visita técnica para avaliar impactos do empreendimento

28/09/2022 - 16:15

A Câmara Técnica de Outorga e Cobrança (CTOC) do Comitê de Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas (CBH Rio das Velhas) recebeu, nesta terça-feira (27), processo de outorga datado de 2015.


O empreendimento, da Superintendência de Desenvolvimento da Capital (SUDECAP), licenciado em 2020 pelo estado, possui intervenções já executadas, em andamento e a iniciar na bacia dos ribeirões Pampulha e Onça e Córrego Cachoeirinha, desde a barragem da Pampulha até a Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) Onça, e promete otimizar o sistema de macrodrenagem na região.

De acordo com a legislação, os Comitês de Bacia devem analisar e deliberar sobre processos de outorga de direito de uso de recursos hídricos de empreendimentos de grande porte e potencial poluidor, bem como de Declarações de Reserva de Disponibilidade Hídrica.

Canalização e retificação

O técnico Leandro Correia, da SUDECAP, apresentou o projeto aos conselheiros da CTOC e assegurou que foram adotadas “soluções que incorporam as melhores práticas ambientais” para permitir “o aumento da capacidade de vazão” dos cursos d’água abrangidos e, conforme relatório da Prefeitura de Belo Horizonte, “reverter os impactos ambientais, sanitários e, sobretudo, sociais gerados pelas recorrentes inundações e enchentes no leito dos cursos de água analisados”.

As obras implicarão remanejamento de tubulações da Copasa (Companhia de Saneamento de Minas Gerais) e da Gasmig (Companhia de Gás de Minas Gerais) e desapropriação de moradias lindeiras, mas Correia sustentou que as intervenções se limitarão “ao mínimo possível”. O servidor da SUDECAP afirmou que também foram consideradas tecnologias para retenção de água na fonte e permeabilização do solo, além de reestudo da mancha de inundação da bacia do Ribeirão Onça.



A história se repete

Para Ronald Guerra, conselheiro da CTOC, “mais uma vez estamos discutindo outorga de empreendimento licenciado e em parte implantado. O Comitê não vai poder participar da construção do projeto”. E emendou: “É preciso definir o rumo: abrir espaço para que o fluxo das cheias possa ocupar seu caminho ou cada vez mais canalizar, numa ocupação urbana que ocupa cada vez mais o lugar dos rios? Falta sincronia, sobra esquizofrenia. É muito ruim discutir um processo de 2015 licenciado em 2020”.

A conselheira Cecília Rute foi na mesma linha: “Mais uma vez poderiam ter convidado o CBH para participar, mas não. Começam a obra, pedem a licença e só depois vêm pedir a outorga. Nos deixa de saia justa. É mais canalização, jogando a enchente para jusante. Parece que nossos engenheiros não estudaram o bastante para saber que córregos não se fecham”.

Rute lembra que enquanto outros países “estão descanalizando, nós continuamos canalizando”, e lamenta: “Canalizar é matar, fechar a tampa do caixão, acabar com o que Deus nos deu de graça. Não dá mais para fazer isso. É muito triste não poder deixar os rios abertos para os nossos netos”.

Rodrigo Silva, representante suplente da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) na Câmara Técnica, criticou o empreendedor: “Existe a possibilidade de pedir autorização emergencial para obras em andamentos, mas primeiramente tem que comunicar ao CBH. Se não o fez, está errado. Existem multas mais pesadas para esses casos”.

Sobre o projeto, porém, avalia que “não está impermeabilizando o curso d’água. O projeto em si é de melhoramento. Canalização a céu aberto tem seu mérito, o descrédito é pela falta de regularização junto ao órgão ambiental e ao CBH”.

Tarcísio Cardoso, titular da CTOC, disse que é “muito difícil escapar dessa situação de obras em andamento que vêm pedir outorga. Estamos sempre ‘remendando’ uma situação. Passamos por isso anos e anos. Se ainda está e em elaboração um projeto, vamos convidar o CBH para participar e não só trazer pronto. Isso deixa os conselheiros indignados”.

Visita

Por sugestão de Cecília Rute, será agendada visita técnica ao local da obra: “Quando se vê no papel, é uma coisa; quando vamos ao local, às vezes é completamente diferente”, pontuou.

Heloísa França, do SAAE Itabirito, apontou: “Essa é uma discussão antiga, 90% dos projetos estão nessa situação, muitos chegam aqui com as obras já concluídas”. Ela propôs separar “o que está concluído e o que ainda vai ser iniciado” e a “devolução do processo do que já está terminado”.

Guerra concordou: “Temo três partes: as obras já ocorreram, as que serão executadas e a discussão do Parque Linear [do Ribeirão Onça]”. Ele considera inadequado conceder “anuência para um conjunto inteiro que tem fases diferentes” e pergunta: “Em que direção vamos com o Parque Linear, será com mais naturalização ou cada vez menos um verdadeiro parque?”. Para ele, “trecho natural é quando o rio é rio, e não um canal, independente da tecnologia, porque deixou de ser um rio natural com seus ciclos e áreas de inundação”.

Leandro Correia informou: “talvez não tenhamos todos os elementos [à época da visita técnica], ainda estamos em fase de estudos topográficos”. Rute defendeu que “o projeto seja apresentado ao Subcomitê Onça, pois eles conhecem a região”, e criticou: “Falta contato com a comunidade, ela tem muitas sugestões e sabe o que é melhor. Por falta disso temos os grandes problemas, decidindo entre quatro paredes o que vai ser feito na vida das pessoas”.

Rodrigo Silva também defendeu a participação: “Essa comunicação do empreendedor com a comunidade é imprescindível. Não se deve fazer as coisas entre quatro paredes, nunca! Acho que a empresa deve tomar as medidas necessárias. Às vezes, por falta de uma simples comunicação são indeferidos os processos”.

Guerra reforçou a proposta de Cecília Rute: “um posicionamento do Subcomitê pode ajudar nesse processo”. Ele espera “abertura para se rever alguns projetos em relação ao Parque Linear” e exortou: “Vale discutir mais, conhecer melhor”.

Ao fim das discussões, a CTOC aprovou a visita técnica, em data a definir. Profissionais da SUDECAP acompanharão os trabalhos de campo para prestar as informações necessárias. O Movimento ‘Deixem o Onça Beber Água Limpa’ também será convidado a tomar conhecimento dos projetos. Após a visita, em nova reunião da CTOC, já com parecer da Agência Peixe Vivo, os conselheiros tomarão sua decisão.


Assessoria de Comunicação do CBH Rio das Velhas:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
*Texto: Paulo Barcala
*Foto: Lucas Nishimoto