Ainda em 2022, a Prefeitura de Ouro Preto, cidade que abriga a nascente do Rio das Velhas, e a Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), colocaram em prática a parceria, firmada meses antes, para monitorar a qualidade das águas, em especial a balneabilidade – adequação a banho, mergulho, etc – de 17 áreas recreativas do município, entre cachoeiras, rios, córregos e lagoas.
Segundo Chiquinho de Assis, Secretário de Meio Ambiente da cidade patrimônio mundial, “no cardápio de convênios com a UFOP, um era o monitoramento da balneabilidade, principalmente das áreas de lazer frequentadas pela comunidade”. “Formalizamos isso na Semana do Meio Ambiente em junho de 2021”, acrescenta.
O professor Aníbal Santiago, do Departamento de Engenharia Civil da Escola de Minas da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) e Doutor pela Universidade Federal de Viçosa, coordena tecnicamente o projeto e conta: “desde que mudei para Ouro Preto, em 2013, havia um fluxo turístico muito grande nas áreas recreativas e vi que era importante conhecer a qualidade. Montamos então um projeto, para Ouro Preto e Mariana. Detectamos vulnerabilidades, o principal problema era na Cachoeira do Brumado, no Rio Doce, mas a ideia morreu por falta de recursos e de apoio institucional”. Ele continua: “Mais recentemente, falei do projeto com o Chiquinho, um profundo conhecedor das 17 áreas recreativas, e ele fez o arranjo”.
O projeto
Pelo combinado, a Secretaria elenca as áreas de coleta, fornece os insumos para os testes e viabiliza o transporte das equipes. À UFOP cabe a análise do material e a publicação do respectivo relatório.
A primeira ida a campo se deu entre abril e maio de 2022. O propósito, diz Assis, é “fazer duas coletas por ano, uma na seca e outra no período de chuvas”, mas “vamos priorizar os locais onde os primeiros resultados acusaram impropriedade”.
Santiago explica que a avaliação é feita “ao final de cinco semanas de coleta, para ter resultados mais consistentes”, que precisam apresentar 80% das amostras dentro dos valores aceitáveis segundo a Resolução 274 Conama [Conselho Nacional do Meio Ambiente]”. Os indicadores aferidos se referem à contaminação fecal, coliformes totais e termotolerantes, com destaque para a bactéria Escherichia coli”.
A intenção da Prefeitura, diz Chiquinho de Assis, é “manter [o projeto] durante toda a gestão” e “ampliar os pontos”. Ele garante que o montante financeiro necessário “já está no orçamento”, e anuncia: “Vamos elaborar Projeto de Lei pra torná-lo permanente”.
As atividades, porém, estão momentaneamente paralisadas, “aguardando os meios para custear insumos e transporte”, informa o professor da UFOP.
Secretário de Meio Ambiente de Ouro Preto, Chiquinho de Assis ressalta a importância do projeto para a atual gestão do município
Sobressalto no Alto Velhas
Dos locais avaliados pela UFOP em 2022, oito pertencem à bacia do Rio das Velhas, todos fartamente frequentados por visitantes de fora e moradores do entorno. As análises mostraram que dois desses pontos – ambos na calha principal do rio, praticamente dentro do núcleo urbano do distrito de São Bartolomeu, indicado há menos de dois anos ao posto de uma das melhores vilas do mundo – tinham água imprópria ao chamado contato primário.
A afixação de placas de alerta gerou surpresa e desconforto na comunidade, ciosa de seu rico patrimônio histórico e natural. Uma reunião foi chamada às pressas e contou com a presença da Secretaria Municipal de Meio Ambiente e da UFOP.
Nova bateria de testes, concentrada em cinco dias consecutivos e em quatro locais, em janeiro deste ano, apontou que a condição da água, na vizinhança do distrito e logo a montante, balança entre satisfatória e imprópria em dois deles e é adequada mais acima. O único que “tomou bomba direto” fica bem abaixo das cobiçadas prainhas e a jusante da Estação de Tratamento de Esgoto (ETE). “Vamos questionar a Saneouro [concessionária do saneamento básico em Ouro Preto], pois a ETE tem que dar conta do recado”, afirmou o secretário.
“O mais importante foi que criamos a oportunidade de unir a comunidade para tratar dessa questão”, realçou. Assis considera que “o problema de manejo nas margens, fezes de animais e outras questões, se não chegou a comprometer, é um sinal de alerta. Vamos lutar para que esse trabalho inclua a recomposição de mata ciliar”.
São Bartolomeu foi uma das localidades visitadas pela UFOP e teve suas águas analisadas
Dois programas do CBH
O Comitê de Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas (CBH Rio das Velhas) mantém ações permanentes de vigilância da qualidade das águas em sua área de atuação: o Biomonitoramento da Ictiofauna inclui a caracterização de parâmetros básicos em 36 pontos de coleta da cabeceira à barra (8 na calha principal), afluentes (16), riachos (7) e lagoas marginais (5); e, com viés na mobilização social, o Monitoramento Ambiental Participativo (MAP), leva a proposta de envolver a população, estreitar relações com os ribeirinhos e transmitir as informações das pesquisas geradas nos programas de biomonitoramento.
Um braço do MAP – muitos, nesse caso – são os “Amigos do Rio”, ação que envolve ribeirinhos que convivem diariamente com o rio, comunicam eventos de mortandade de peixes e, após treinamento, coletam dados sobre características do curso d’água.
Pia Chaves, coordenadora da Escola Municipal de São Bartolomeu há cerca de 15 anos e moradora há mais de 40, é Amiga do Rio. Todo mês ela coleta amostras da água do Rio das Velhas e utiliza o EcoKit para medir parâmetros como temperatura, oxigênio dissolvido, pH e outros, além de anotar suas observações sobre turbidez, nível do rio, presença de peixes e de materiais flutuantes e ocupação do entorno.
Os dados são remetidos ao núcleo técnico do programa, que tem a direção do biólogo Carlos Bernardo Alves, pesquisador do Projeto Manuelzão, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Pelas análises dos últimos 12 meses, Pia informa que a qualidade das águas no Alto Velhas, na altura de seu distrito de adoção, admite os diversos usos recreativos.
Ela conta que a escola também vai ao rio, propósito do programa que se espalha pelas 23 Unidades Territoriais Estratégicas (UTEs) da bacia. Alunos e professores participam das atividades, recebem oficinas periódicas, desenvolvem conhecimento e criam laços com a preservação. “Nosso papel”, ensina, “é envolver as crianças, porque elas se tornam parte do rio e vão defendê-lo, incorporam essa consciência e trazem as famílias junto”.
Assessoria de Comunicação do CBH Rio das Velhas:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
*Texto: Paulo Barcala
*Foto: Fernando Píancastelli; Leo Boi