Revista Rio das Velhas: O direito humano à água

09/09/2016 - 13:19

Ponto 1: A água é um bem social essencial a vida humana e de todos os seres vivos, e, portanto, se insere como um direito humano

Texto: Luiza Baggio

A água é essencial para a vida humana e indispensável para garantir um conjunto de outros direitos humanos, tais como, o direito à vida e saúde. Contudo, de acordo com dados da Organização das Nações Unidas (ONU) ainda existem no mundo 884 milhões de pessoas sem acesso a fontes de água de qualidade.

Apesar deste número já contribuir para se obter uma ideia relativamente da situação preocupante, a verdade é que a realidade é muito pior, uma vez que milhões de pessoas que vivem em habitações informais não são contabilizadas nas estatísticas.

A falta d’água em estados do sudeste brasileiro trouxe à tona a discussão sobre o acesso a esse serviço como direito básico dos cidadãos. Contudo, o que podemos observar é que o Brasil vive um significativo déficit de saneamento. O Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab), aprovado em dezembro de 2013 pelo Governo Federal, revela que cerca de 40% da população brasileira, 77 milhões de habitantes, não tem acesso adequado à água.

E na Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas? Você acredita que o acesso à água é diferente dos números acima?

Com a proposta de promover uma reflexão sobre água a partir da perspectiva da garantia de um serviço fundamental para uma mínima qualidade de vida, o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas lançou a campanha Água como Direito Humano.

A campanha está norteando as ações do Comitê em 2016 e procura reforçar que o acesso a água de qualidade é um direito humano fundamental, e deve ser garantido a todos, além de manter todas as formas de vida.

Para assegurar a qualidade das águas para a população humana é fundamental garantir o saneamento para todos. Sem tratamento adequado para os esgotos domésticos, industriais e resíduos sólidos, os rios serão poluídos e degradados, inviabilizando o uso da água para consumo humano e para manter a integridade biótica.

Por outro lado, é fundamental garantir os mananciais de águas existentes. Os cursos d’água refletem os modelos e o processo de ocupação territorial em sua bacia hidrográfica, de forma que a degradação da qualidade e impactos na quantidade de água se intensificaram a partir dos modernos usos humanos.

Por isso, o CBH Rio das Velhas chama a coletividade, a debater, discutir e se articular para a manutenção da quantidade e qualidade de água e, principalmente, para a garantia dos diversos usos, da biodiversidade e dos direitos considerados fundamentais a todas as pessoas e que hoje não são plenamente garantidos. Tal questão é fundamental para o fortalecimento da gestão das águas, uma vez que as consequências para a saúde da população impõem mudanças drásticas na atuação de todos os atores.

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Campanha Água como Direito Humano. Crédito: Lucas Nishimoto e Ohana Padilha

Principais pontos da Campanha:

1) A campanha Água como Direito Humano propõe um debate na Bacia do Rio das Velhas com foco nos seguintes pontos:
2) A água é um bem social essencial à vida humana e de todos os seres vivos, e, portanto, insere-se como um direito humano;
3) É um dever da sociedade e do poder público garantir água de qualidade e quantidade para esta e as futuras gerações;
4) É inadmissível a degradação e poluição dos rios, nascentes e lagos, bem como danos e morte da biota aquática e da biodiversidade;
5) O fornecimento de água tratada e serviços de esgotamento sanitário devem ser disponibilizados a preços justos que propiciem a todos os cidadãos o direito de usufruir dos mesmos para o bem da qualidade de vida e saúde de todos;
6) O saneamento ambiental deve ser prioridade de governo e deverá ser garantido a todos os cidadãos;
7) É fundamental integrar a gestão ambiental e de recursos hídricos para compatibilizar desenvolvimento econômico com sustentabilidade ambiental;
Os planos municipais de saneamento têm que ser efetivamente implantados, definindo metas a serem alcançadas com a efetiva participação social;
8) É dever da sociedade e do poder público preservar a integridade ecossistêmica para manter os rios e mananciais preservados;
9) Nenhum rio poderá ser classificado para além de Classe II (Conama);
10) Dar continuidade ao plano de metas para a revitalização do Rio das Velhas.

O acesso à água é um direito

Entender que o acesso à água de qualidade é um direito fundamental é reconhecer que ele é inerente à condição humana e deve ser garantido a todos os seres humanos, independentemente de raça, sexo, nacionalidade, etnia, idioma, religião ou condições financeiras. O acesso à água de qualidade está diretamente ligado ao direito à saúde, que em nossa Constituição é estabelecido pelo Artigo 196: “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco da doença e de outros agravos e de acesso universal e igualitário às ações e aos serviços para sua promoção, proteção e recuperação”.

Esse direito deve ser associado também ao artigo 225 da Constituição brasileira que estabelece: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

Queremos água de qualidade

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) ao lançar a Campanha da Fraternidade 2016, voltada para a questão do saneamento, afirma no seu documento que “morre uma criança a cada 3 minutos por não ter acesso à água potável, por falta de redes de esgoto e de higiene”. É preciso também lembrar que as epidemias de Dengue, Chikungunya e Zika transmitidas pelo Aedes Aegypti, estão associadas à veiculação pelas águas e são propiciadas pelas condições precárias de saneamento.

Para garantir a qualidade das águas para as populações humanas é fundamental garantir o saneamento para todos. Sem tratamento adequado para os esgotos domésticos, industriais e os resíduos sólidos, nossos rios serão poluídos e degradados, inviabilizando o uso da água para consumo humano e para manter a integridade biótica.

É fundamental garantir os mananciais de águas existentes. Os cursos d’água refletem os modelos e o processo de ocupação territorial em sua bacia hidrográfica, de forma que a degradação da qualidade e impactos na quantidade de água se intensificaram a partir dos modernos usos humanos.

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Em cima: Ribeirão Arrudas em Belo Horizonte. Embaixo à esquerda: Extração artesanal de areia, Várzea da Palma. Embaixo à direita: Belo Horizonte. Crédito: Bianda Aun, Marcelo Andre e Lucas Nishimoto.

A água é um bem público

Em setembro de 2015, o Parlamento Europeu aprovou um Projeto de Lei de iniciativa popular a Right Water com o tema: “A água e o saneamento são um direito humano! A água não é um bem comercial, mas um bem público”. Esta Lei assegurou que todos os habitantes gozem do direito à água e ao saneamento; que o abastecimento de água e a gestão dos recursos hídricos não sejam sujeitos a “regras do mercado interno” e que os serviços hídricos fossem excluídos da liberalização; bem como uma intensificação de esforços da União Europeia para alcançar o acesso universal à água e ao saneamento.

A Lei reconheceu que os serviços de água e saneamento são de interesse geral, que a água é um bem comum e, por conseguinte, deve ser disponibilizada a preços justos que possibilitem aos cidadãos usufruírem do direito a uma água de boa qualidade e ao saneamento ambiental.

Queremos água em quantidade

Estimativas recentes anunciam que o aquecimento global aumentará em cerca de 20% a escassez de água no mundo, assumindo também que, até o meio deste século, 2 bilhões de pessoas, em 48 países sofrerão os impactos caso não haja uma mudança de comportamento mundial do uso da água.

Passamos nos últimos três anos uma grave crise hídrica nas Bacias Hidrográficas do Rio das Velhas e do São Francisco, o que demonstra que as previsões podem se confirmar a qualquer tempo. Por outro lado, crimes ambientais têm sido cometidos comprometendo a vitalidade dos mananciais de água e matando os nossos rios.

Tendo em vista que a diminuição da vazão e contaminação de rios, a carência de acesso à água por comunidades vulneráveis e marginalizadas, a existência de disputas e conflitos pelo uso da água é uma realidade no contexto diversificado na Bacia do Rio das Velhas, é imprescindível considerar o debate sobre água a partir da perspectiva da garantia de um serviço fundamental para uma mínima qualidade de vida.

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Da esquerda p/ baixo: Rio das Velhas na ETA Bela Fama (Nova Lima). Rio das Velhas durante a crise hídrica de 2014 Honório Bicalho, distrito de Nova Lima. Qualidade das águas para seus variados usos. Direita: Água, um direito de todos. Crédito: Acervo Copasa, Bianca Aun e Fernando Piancastelli.

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