Região do Alto Rio das Velhas possui mais de 40 barragens de rejeitos
Texto: Luiza Baggio
O Alto Rio das Velhas compreende a região denominada Quadrilátero Ferrífero, tendo o município de Ouro Preto como o limite ao sul e Belo Horizonte, Contagem e Sabará como limite ao norte. Uma porção do município de Caeté faz parte desta região, tendo a Serra da Piedade como limite leste.
Existem 46 barragens de rejeitos na região do Alto Rio das Velhas, de acordo com o Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM). E danos como os que foram causados pelo rompimento da barragem Fundão da mineradora Samarco, em novembro de 2015, entre os distritos de Mariana e Ouro Preto que provocou uma onda de lama preocupam o Comitê da Bacia
Hidrográfica do Rio das Velhas (CBH Rio das Velhas).
O CBH Rio das Velhas, por meio de sua Câmara Técnica de Outorga e Cobrança (CTOC), realizou um debate sobre as responsabilidades e as atuações dos órgãos fiscalizadores competentes das estruturas de barramentos presentes na Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas, principalmente na região do Alto Rio das Velhas.
Nessa região, encontram-se importantes mananciais de abastecimento de água do Sistema Rio das Velhas, como por exemplo, Bela Fama, em Nova Lima, que é responsável por abastecer 60% da Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), sendo que 40% dos municípios da RMBH situam-se à jusante destes barramentos.
Diante disso, o CBH Rio das Velhas encaminhou ofícios a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Minas Gerais (Semad), Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam), Fundação Estadual de Meio Ambiente (Feam), Ministério Público do Estado de Minas Gerais (MPMG), Superintendência Regional de Regularização Ambiental (Supram) e Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) requerendo informações sobre a segurança das barragens de rejeitos situadas na Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas, sendo que em pelo menos 12 das barragens existentes as auditorias, conforme a Lei Federal n°12.334/2010, não garantiram suas estabilidades.
Em resposta, o Igam informou ao CBH Rio das Velhas que as estruturas de barragens declaradas em 2015 como em ‘situação de estabilidade não garantida’ pelo auditor ou a auditoria não concluiu a avaliação por falta de dados ou documentos técnicos, foram classificadas em três grupos:
1) Judicialização: são as barragens há muito tempo sem garantia de estabilidade, abandonadas, em locais interditados, em minas paralisadas ou que não cumpriram a legislação vigente. A situação dessas barragens foi encaminhada para a Auditoria Geral do Estado (AGE) tomar as devidas providências.
2) Solicitação de nova auditoria: são as barragens de Maior Dano Potencial Associado (DPA). Foi encaminhado um ofício aos empreendedores de cada barragem que se encontra nesta situação, estipulando um prazo de reposta que será analisada pela Feam e, assim, adotadas as medidas administrativas e judiciais cabíveis.
3) Solicitação de Inspeção de Urgência: são as barragens de menor porte e de menor DPA. Foi encaminhado um ofício aos empreendedores de cada barragem que se encontra nesta situação, estipulando um prazo de reposta que será analisada pela Feam e, assim, adotadas as medidas administrativas e judiciais cabíveis.
Rompimento da Barragem em Mariana
Com o rompimento da barragem Fundão da Samarco Mineradora, o distrito de Bento Rodrigues foi destruído e centenas de pessoas ficaram desabrigadas. A lama alcançou outros distritos de Mariana, como Águas Claras, Ponte do Gama, Paracatu e Pedras, além da cidade de Barra Longa. Até dezembro de 2015, 16 mortos haviam sido identificados e três pessoas ainda estavam desaparecidas. Os rejeitos foram levados pelo Rio Doce, afetando ainda dezenas de cidades na Região Leste de Minas Gerais até o Espírito Santo, com a falta de água potável. E no dia 22 de novembro, a lama chegou ao mar, no município capixaba de Linhares.
O presidente do CBH Rio das Velhas, Marcus Vinícius Polignano, explica os impactos ambientais na Bacia do Rio Doce. “A maior parte dos danos causados pelo rompimento da barragem serão permanentes. Os 50 milhões de m³ de rejeitos de minério de ferro que formaram o mar de lama mudou o ecossistema por onde passou. O que existia antes desta tragédia não existirá mais. Como a lama é muito densa ela faz uma espécie de pavimentação por onde passa destruindo a biota. Os impactos são de uma magnitude absurda”, explica.
Rio Doce
Transformado em uma correnteza espessa de terra e areia, o Rio Doce não pode ter sua água captada. Para Polignano, um dos mais graves efeitos do despejo do rejeito nas águas é o assoreamento de rios e riachos, que ficam mais rasos e têm seus cursos alterados pelo aumento do volume de sedimentos.
O presidente do CBH Rio das Velhas juntamente com uma equipe de pesquisadores do Projeto Manuelzão da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), percorreu parte da Bacia do Rio Doce para avaliar a extensão dos danos ambientais causados pelo rompimento da barragem Fundão da Samarco. A equipe ficou impressionada com a proporção dos estragos ocasionados e com a dimensão da tragédia.
Para Marcus Vinícius Polignano, os rios que não foram afetados pelo rompimento das barragens e que são afluentes do rio Doce podem ajudar a salvá-lo. “Um caminho para salvar o Rio Doce é investir nos cursos d`água que ainda possuem qualidade e quantidade de água para que eles ajudem a fazer a remoção gradual do resíduos que acontecerá ao longo de décadas. Não podemos esperar milagres desse processo que será extremamente demorado”, esclarece.
Enquanto está em suspensão no rio, a lama impede a entrada de luz solar e a oxigenação da água, além de alterar seu pH, o que sufoca peixes e outros animais aquáticos. A força da lama ainda arrastou a mata ciliar, que tem a função ecológica de dar proteção ao rio. A perda da biodiversidade pode demorar décadas para ser reestabelecida. E isso ainda vai depender de programas montados para esse fim. Também existe a possibilidade de espécies endêmicas (que existem só naquela região) serem extintas.
Para Polignano, Mariana entra para a história como uma “ferida aberta”. “Essa tragédia é a prova de que nossa gestão ambiental precisa ser melhor desempenhada”, explica.
Pesquisadores do Projeto Manuelzão avaliam os danos causados no Rio Doce
Agenda Estratégica Cinza – Mineração
O Plano Diretor de Recursos Hídricos (PDRH) do CBH Rio das Velhas possui as Agendas Estratégicas (laranja, cinza, azul, verde e marrom) que descrevem a situação atual das principais atividades na Bacia. A Agenda Estratégica Cinza dispõe sobre a mineração e mostra o percentual das áreas de mineração nas Unidades Territoriais Estratégicas.
O PDRH prevê as seguintes ações para a Agenda Estratégica Cinza:
• Limitar o impacto negativo da atividade de mineração especialmente sobre os recursos hídricos subterrâneos, em função da sua maior concentração em UTEs na bacia com maior criticidade em termos de águas subterrâneas;
• Certificar que outros usos da água possam assegurar sua sustentabilidade em termos de recursos hídricos, em especial os usos para conservação e os usos racionais para ocupação urbana;
• As ações executivas previstas no PDRH estão organizadas hierarquicamente com vistas ao controle de carga poluidora, erosão e segurança de barragens relacionadas com as atividades do segmento de mineração e com a recuperação de áreas degradadas.
Histórico de rompimento de barragens em Minas Gerais
No dia 10 de setembro de 2014, uma avalanche de lama deslizou sobre trabalhadores, caminhões e tratores, depois do rompimento de uma barragem de rejeitos de minério de ferro em Itabirito, a 55 quilômetros da capital. O rompimento da barragem deixou Minas Gerais em alerta sobre a segurança de seus mais de 700 reservatórios. O acidente na área da Mina Retiro do Sapecado, operada pela empresa Herculano Mineração, deixou seis pessoas soterradas – três delas morreram – e provocou graves danos ambientais em córregos da Bacia do Rio das Velhas.
Além de Itabirito e Mariana, Minas Gerais registrou outras três grandes tragédias decorrentes do rompimento de barragens de rejeitos nos últimos quinze anos. Em 2001, cinco pessoas morreram no distrito de São Sebastião das Águas Claras, mais conhecido como Macacos, em Nova Lima, após o deslizamento de toneladas de lama da Mineração Rio Verde. Além das mortes, o acidente provocou danos ambientais como o assoreamento do Córrego das Taquaras. Dois anos depois, uma barragem de rejeitos industriais se rompeu em Cataguases, na Zona da Mata, liberando 1,2 bilhão de litros de lignina – resíduo da produção de celulose – nos rios Pomba e Paraíba do Sul. Em 2007, cerca de 4.000 moradores das cidades de Miraí e Muriaé, também na Zona da Mata, ficaram desabrigados por causa do rompimento da barragem da Mineradora Rio Pomba Cataguases. Plantações e pastagens foram destruídas e o abastecimento de água ficou comprometido em cidades mineiras e fluminenses.
Rompimento da barragem da Herculano Mineração em Itabirito (2014)