A área conhecida como Ponte de Arame do Rio das Velhas, situada no município de Itabirito, foi uma das cinco frentes abertas após a assinatura do Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) Segurança Hídrica, de R$ 2,05 bilhões, firmado pela mineradora Vale com o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) após o rompimento da barragem de Córrego do Feijão, em Brumadinho, tragédia que deixou 272 mortos no ano de 2019.
A obra de barramento e captação a fio d’água no Rio das Velhas se somaria a várias outras, destinadas a assegurar a segurança hídrica dos mais de 5 milhões de habitantes da Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), dentre elas uma nova captação no Rio Paraopeba, acima do ponto onde foram despejados os milhões de metros cúbicos de rejeitos da barragem rompida; novas captações a fio d’água no Ribeirão da Prata e no Ribeirão Macaúbas; ampliação do Sistema Rio Manso e construção de nova adutora de transferência entre os Sistemas Paraopeba/Velhas.
Sobre o alto curso do Rio das Velhas, que abastece 45% da RMBH e ficou sobrecarregado com a interrupção da captação no Paraopeba, paira o risco permanente representado por 67 barragens e diques de mineração que se espalham pelo chamado Quadrilátero Ferrífero, a montante da Estação de Bela Fama, da Copasa (Companhia de Saneamento de Minas Gerais), em Nova Lima.
Preservação e assoreamento
A escolha da Ponte de Arame como um dos possíveis locais de intervenção despertou preocupações entre ambientalistas, pesquisadores e conselheiros do Comitê de Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas (CBH Rio das Velhas).
Marcus Vinícius Polignano, secretário do CBH Rio das Velhas, aponta as lacunas: “Não foram feitos levantamentos de impactos ambientais, a questão não foi debatida nem chegou ao Comitê da Bacia. Um barramento ali mudaria toda dinâmica do rio. Sem falar que ali perto tem a barragem de Acuruí, que já está muito assoreada, pela característica do próprio rio naquela altura. Isso afetaria uma nova captação”.
De fato, a nova represa estaria imediatamente abaixo de outro barramento, até então único na calha do rio, da Pequena Central Hidrelétrica (PCH) Rio de Pedras, operada pela Cemig (Companhia Energética de Minas Gerais), em estado avançado de assoreamento.
Indagada sobre as garantias de que o reservatório de Ponte de Arame não sofreria o mesmo efeito no curto ou médio prazo, como sua vizinha Rio de Pedras, a Copasa informou que foi “realizado o estudo de viabilidade do barramento, porém ainda não foi concluído o projeto básico”. A empresa declara que ambos os documentos “levam em conta fatores hidrológicos e de carreamento de sedimentos nas modelagens realizadas avaliando a vida útil do empreendimento bem como os riscos de falha associados. Sendo que na avaliação do volume morto (ou reserva estratégica) foram utilizados dados de monitoramento sedimentológico da bacia de contribuição da PCH Rio de Pedras, incluindo informações do Rio Maracujá e outras vertentes”.
Ronald Guerra, coordenador da Câmara Técnica de Planejamento, Projetos e Controle (CTPC) do CBH Rio das Velhas, destaca ainda outro ângulo: “A proposta de barramento ocorre numa região única do rio, um cânion encaixado, com várias cachoeiras, de uma beleza cênica muito grande, que poderia ser mais bem aproveitada como atividade turística. O mais importante ali era se ter uma unidade de conservação, um parque linear amplo interligando todas as Unidades de Conservação do entorno, garantindo mais proteção para as áreas de preservação permanentes (APPs). É preciso trabalhar a região de uma forma voltada para o turismo e para a preservação do patrimônio natural”.
Marcus Vinicius Polignano e Ronald Guerra falaram sobre o local de intervenção
Situação atual
As intervenções em Ponte de Arame, que estavam na fase de estudos de viabilidade, a cargo da Vale, foram interrompidas ante a descoberta de vestígios arqueológicos, como fragmentos de cerâmica.
A empresa comunicou o achado ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e contratou equipe especializada em arqueologia, “que já está trabalhando no local”, diz a Vale.
Em reunião do último dia 9, organizada pela Coordenadoria Regional das Promotorias de Justiça do Meio Ambiente das Bacias dos Rios das Velhas e Paraopeba do MPMG, que contou com a presença do vice-presidente do CBH Rio das Velhas, Renato Constâncio, foram apresentadas informações sobre as atividades desenvolvidas no âmbito do TAC Segurança Hídrica. Segundo o MPMG, os estudos em Ponte de Arame têm conclusão prevista para outubro de 2024.
“Hoje, lá, é só sondagem, com intervenção mínima”, diz Constâncio, pois Ponte de Arame “é uma das alternativas estudadas e uma das últimas, porque opções anteriores já estão em execução”, como a ampliação do sistema Manso, e soluções de transferência de água tratada do Paraopeba para o Velhas, além de investimento da própria Copasa na modernização da ETA Bela Fama.
O assunto voltará à pauta do CBH Rio das Velhas na próxima reunião do Convazão, o Grupo Gestor de Vazão do Alto Rio das Velhas, prevista para 25 de agosto.
Polignano vai ao ponto: “Os esforços têm de ser para manter a vitalidade dessas bacias hidrográficas. Porém, é também urgente que se discutam as áreas de recarga dessas bacias, pois, sem isso, mesmo antes de uma contingência, não se terá água suficiente”.
Assessoria de Comunicação do CBH Rio das Velhas:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
*Texto: Paulo Barcala
*Fotos: Bianca Aun; Leo Boi;