Conquistas e desafios na implementação do Parque Ciliar Comunitário do Ribeirão Onça

08/01/2025 - 15:15

Depois de anos de trabalho e mobilização social da população, o tão sonhado Parque Ciliar Comunitário do Ribeirão Onça, situado na região Nordeste da capital mineira, vai ser implementado pela Prefeitura de Belo Horizonte (PBH). A expectativa é que as obras comecem já no início de 2025.


A demanda pela construção de um Parque Ciliar Comunitário no Ribeirão Onça é uma luta que se estende há quase 20 anos pelas comunidades do entorno, movimentos sociais e entidades socioambientais. Mesmo com o cotidiano difícil, os moradores ansiavam por uma qualidade de vida melhor e um desejo de regenerar o Ribeirão Onça, um dos principais afluentes do Rio das Velhas.

Esse desejo levou os moradores a pressionarem a PBH para retirada das famílias às margens do ribeirão, que sofriam com recorrentes inundações que invadem as moradias em períodos de chuvas. Nos espaços deixados pelas famílias, o sonho era construir um Parque Comunitário.

“Atualmente, a Sudecap [Superintendência de Desenvolvimento da Capital] é a responsável pelo projeto, enquanto a Urbel [Companhia Urbanizadora e de Habitação de Belo Horizonte] segue com as desapropriações. Já foram removidas mais de 900 famílias das margens do córrego, exatamente nas áreas que costumavam ficar alagadas nos períodos de chuvas. Outras 600 famílias estão sendo retiradas”, conta Maria Clara Rêgo, Superintendente de Meio Ambiente da PBH.

Em 2015, com apoio de dois movimentos essenciais para a luta, o Conselho Municipal Unidos Pelo Ribeiro de Abreu (Comupra) e o Movimento Deixem o Onça Beber Água Limpa, as comunidades do território elaboraram uma proposta de parque para a Prefeitura. O projeto inclui áreas de preservação e conservação, agricultura urbana, prática esportiva, interação com a natureza e inúmeras atividades comunitárias pautadas em uma Educação Ambiental.

Carla Wstane faz parte do Comupra e retomou sua participação ativa no Subcomitê Ribeirão Onça recentemente, mas seu vínculo com a causa e o território se moldou há muitos anos. Acompanhando de perto a mobilização das comunidades, ela destaca a persistência dos moradores em reimaginar o território, à medida que algumas famílias foram sendo realocadas. “A comunidade, com apoio da Urbel, começou a ocupar de forma coletiva esses lugares. Então ali, no Baixo Onça, tem um espaço que é onde as primeiras famílias foram realocadas, a gente chama de Espaço Vitrine, que é onde a gente começou a construir, desde 2016, um tanto de parquinhos, campo de futebol, agrofloresta, horta comunitária. Antes da própria prefeitura iniciar as obras do parque, a comunidade já começou a ocupar esses espaços de forma comunitária. Elas já vêm fazendo essa ocupação de forma coletiva”.


Confira mais fotos do último “Deixem o Onça Beber Água Limpa”: 


Desafios no caminho

Com uma extensão de 5,5 quilômetros, o parque será um dos maiores de Belo Horizonte, passando pelos bairros São Gabriel, Vila São Gabriel, Ouro Minas, Vila Fazendinha, Novo Aarão Reis, Belmonte, Ribeiro de Abreu, Conjunto CBTU (Novo Tupi), Conjunto Ribeiro de Abreu, Casas Populares (Ribeiro de Abreu) e Monte Azul.

A responsabilidade da elaboração de um projeto final está com os técnicos, arquitetos e engenheiros da Sudecap, em diálogo com representantes das comunidades locais. Mesmo com a implantação do parque, um antigo problema preocupa a PBH: os alagamentos na região.

Em reunião ordinária do Conselho Municipal de Meio Ambiente (COMAM), em 24 de abril de 2024, a Sudecap apresentou um projeto de derrocagem do Ribeirão Onça, como a alternativa técnica de controle de cheias. O derrocamento consiste no afundamento de quatro metros do Ribeirão Onça, onde ele tem seu leito natural, e seria realizado em um trecho de 1,6 km, na altura dos bairros Ribeiro de Abreu e Aarão Reis. Tanto o parque, quanto a derrocagem, estão atrelado a um mesmo empreendimento, denominado “Otimização do Sistema de Macro e Microdrenagem das Bacias dos Ribeirões Pampulha, Cachoeirinha e Onça”.

“Mesmo com essa quantidade significativa de remoções, que parece ser muito oneroso para a prefeitura, ainda há muitas outras famílias em área de risco de inundação nesse longo trecho do Ribeirão Onça. Para resolver este problema seria necessário respeitar a Área de Proteção Permanente (APP) do ribeirão e, consequentemente, realizar ainda mais despejos, o que também é uma medida com diversos impactos sociais. Para resolver o problema com as inundações e para garantir o respeito à APP do Onça, o parque deveria ser muito maior. Só que o que chega até nós é que a prefeitura não tem recurso para isso e, evidentemente, ela tem que proceder com alguma medida que resguarde essas famílias que sofrem com as inundações”, explicou Bruno Guerra, membro da equipe de Mobilização Social e Educação Ambiental do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas (CBH Rio das Velhas)

Os impactos dessa manobra não foram discutidos com clareza, algo que incomodou profundamente os representantes da população. Segundo Bruno, “Vai descaracterizar não só o trecho ali. Porque se você faz esse tipo de obra você muda completamente a velocidade, o regime hidráulico, o que interfere em todo o trecho à jusante. Então, essa obra muito provavelmente traria impactos sobre todo o trecho que vem depois desses 1.6 km até chegar ao Rio das Velhas”.

O Subcomitê Ribeirão Onça, em diálogo com o Comupra, elaborou um documento de Ofício direcionado à Secretaria Municipal de Meio Ambiente (SMMA), à Sudecap, à Diretoria de Licenciamento Ambiental (DLAM) e ao COMAM. O texto expressa preocupação com os efeitos da derrocagem e sua aprovação pelo conselho.

“O SCBH Onça tem um posicionamento consolidado de valorização e revitalização dos mananciais urbanos em leito natural, em contraposição às canalizações, tão difundidas pela cidade de Belo Horizonte. A derrocagem, por outro lado, se apresenta como uma intervenção irreversível em um rio no qual julgamos não “estar morto” – conforme chegou a ser debatido na reunião – e, portanto, entendemos que sua revitalização perpassa pela conservação dos aspectos naturais que ele ainda guarda. Ademais, destacamos que não somente as nascentes, mas a própria calha fluvial, pode ser um local de exfiltração e de percolação da água, em permanente contato com as águas subterrâneas. Sendo assim, a brusca intervenção no leito do rio impacta diretamente estas trocas, contrariando, portanto, uma meta basilar do Comitê do Velhas, que é a produção de água na bacia”, finalizaram o Subcomitê e o Comupra no texto do ofício.

Segundo Carla Wstane, o diálogo com as entidades da Prefeitura tem sido profícuo, na grande maioria das vezes, mas, nesse caso, a linguagem técnica utilizada pelos profissionais acaba deixando a informação turva para compreensão. “A Sudecap tem rodado as comunidades mas esse ponto da derrocagem está sendo trazido com uma linguagem muito técnica e as pessoas não estão entendendo. E as pessoas estão mais preocupadas com onde elas vão morar do que com a implantação do parque em si, considerando que o parque é uma decorrência também da realocação das pessoas”.

Expressado no texto do ofício, os representantes do Comupra e do Subcomitê Ribeirão Onça pedem uma nova reunião e apresentação do projeto, aproveitando para uma devolutiva das dúvidas enviadas.


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Demandas da comunidade

Os movimentos Deixem o Onça Beber Água Limpa e o Comupra são dois elementos chave na negociação das conquistas sobre as demandas da comunidade. Em 2024, a edição do 16ª Deixem o Onça Beber Água Limpa, evento anual que celebra e mobiliza a sociedade em prol do Ribeirão Onça, trouxe como tema um sonho compartilhado, a Meta 2025: Nadar, brincar e pescar no Ribeirão Onça.

“Construímos as metas em 2010, 2014 e sempre pensando que as metas são ferramentas que nos ajudam a articular de forma intersetorial com vários atores, por exemplo, com a Prefeitura, com a Copasa, com os Comitês e construir uma visão de mundo e possibilidades. As metas servem como formas da gente caminhar”, finaliza Carla.

Esse sonho engloba alguns objetivos importantes para alcançar o equilíbrio novamente: realocação de todas as famílias do entorno, tratamento do esgoto, construção de um novo acesso ao bairro Ribeiro de Abreu, municipalização da MG-020 e a implementação do Parque Ciliar.


Assessoria de Comunicação do CBH Rio das Velhas:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
*Texto: Yasmim Paulino
*Fotos: Yasmim Paulino; Bianca Aun