Revista Velhas nº 3: Guardiã das águas que abastecem a RMBH

17/01/2025 - 10:00

Conheça a Unidade Territorial Estratégica Rio Itabirito, uma região prioritária para a conservação e gestão das águas


A Unidade Territorial Estratégica (UTE) Rio Itabirito, com seu centro no município de Itabirito, é um exemplo notável de engajamento comunitário e luta pela preservação ambiental. Com uma rica história, esse território se destaca por suas características ambientais, econômicas e culturais. Localizada na região do Alto Rio das Velhas, a UTE abriga ainda parte dos municípios de Rio Acima e Ouro Preto.

Os principais cursos d’água da unidade são o Rio Itabirito, Ribeirão Mata Porcos, Ribeirão do Silva, Córrego do Mango e Ribeirão Bação. Além disso, o Rio das Velhas percorre 73 km dentro dos limites da UTE, desempenhando um papel fundamental na hidrografia local. As águas do Rio Itabirito fluem em direção ao Velhas, contribuindo significativamente para o abastecimento da população da Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH).

A UTE Rio Itabirito abriga quatro Unidades de Conservação que, parcialmente inseridas em seu território, somam aproximadamente 9.586,49 hectares de áreas protegidas, representando 17,47% da área total. Toda a área da UTE está inserida no Quadrilátero Ferrífero, uma região considerada prioritária para a conservação devido à sua riqueza ecológica e importância ambiental.

Esse contexto destaca a UTE Rio Itabirito como um território estratégico não apenas para a conservação ambiental, mas também para garantir a segurança hídrica de uma vasta população. As ações de preservação e gestão sustentável na região são essenciais para manter a qualidade e a quantidade dos recursos hídricos que abastecem a RMBH.

Gestão compartilhada, combatividade e defesa do território

Rio Itabirito é o principal afluente do Velhas na região e contribui para o abastecimento da RMBH.

Instituído no dia 12 de maio de 2006, o Subcomitê Rio Itabirito tem desempenhado um papel fundamental na defesa da região contra empreendimentos que ameaçam a qualidade e a quantidade das águas locais e contra a ocupação desordenada de Áreas de Preservação Permanentes (APPs). Para Frederico Arthur Souza Leite, secretário de Meio Ambiente de Itabirito e coordenador do Subcomitê Rio Itabirito, além da combatividade, a principal característica do colegiado é a coparticipação de representantes das esferas pública, privada e sociedade civil. “Mais recentemente, o Subcomitê tem se destacado por seus projetos inovadores, principalmente por aqueles projetos articulados em conjunto com outros Subcomitês limítrofes,
como o Nascentes”, conta.

Heloísa França, secretária-ajunta do CBH Rio das Velhas, é também integrante do Subcomitê Rio Itabirito desde 2011, como representante do SAAE (Serviço Autônomo de Saneamento Básico) de Itabirito. O engajamento dos membros e a organização do colegiado são, para ela, as características mais marcantes do Subcomitê. “Todas as propostas são trazidas para as reuniões e os debates são assíduos. Temos um grande respeito entre os membros, e todos ali representados são ouvidos. Os encontros são sempre muito produtivos. Temos também um trabalho de mobilização muito bem-feito na bacia. As pessoas que participam do Subcomitê têm grande conhecimento da área, não é simplesmente um senso de preservação. Elas conhecem as particularidades da unidade territorial e de cada microbacia”, ressalta.

A luta contra empreendimentos potencialmente danosos à região é uma marca registrada do Subcomitê. Um exemplo significativo foi a tentativa de instalação de um empreendimento minerário na Serra da Moeda, próximo à comunidade de Ribeirão do Eixo. O Subcomitê, junto à prefeitura e à comunidade conseguiu barrar o empreendimento e impulsionar a criação de uma unidade de conservação no local. Moradora da comunidade, Lucélia Maria da Silva conta que a luta foi árdua. “Na época, fizemos uma mobilização intensa, colocamos outdoors explicativos, chamamos a atenção da imprensa e realizamos vários encontros com a comunidade. Tivemos um grande apoio do Subcomitê, que mapeou as mais de 60 nascentes localizadas na região. O Projeto Manuelzão também foi peça-chave no processo e ensinou à população a importância de preservarmos as nossas águas. Com todo esse engajamento e união, conseguimos barrar o empreendimento”, relembra Lucélia.

Atualmente, o foco da luta é contra a instalação de um terminal de minério, pela empresa Bação Logística, próximo à comunidade tricentenária de São Gonçalo do Bação, distrito de Itabirito. Elias Costa de Rezende, morador da comunidade e membro do Subcomitê, explica que junto com o Terminal vem as estradas por onde transitam caminhões carregados de minério de várias minas e que há também um movimento das mineradoras para viabilizar uma mineração, a FLAPA Engenharia e Mineração, cujo corpo mineral está a 120m de profundidade, o que acarretará o rebaixamento do lençol freático. “Esse terminal de minério se encontra a montante da cachoeira Bem-Vinda, que é um atrativo turístico da região e é totalmente circundado por cursos d’água. A lama que é produzida por esse trânsito de caminhões, principalmente na época das chuvas, vai toda para esses cursos d’água, causando a degradação do Ribeirão Carioca”, ressalta Elias.

Por conta de todas essas ameaças, o Subcomitê Rio Itabirito está mobilizando esforços para proteger a região. Segundo ele, o próximo passo é um Parecer Único a ser emitido pela FEAM (Fundação Estadual do Meio Ambiente) que pode deferir ou indeferir o licenciamento para a implantação do terminal. O prazo total para a análise do licenciamento é de até 12 meses, mas pode ser suspenso caso a Semad (Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável) exija mais informações.

Elias Rezende é uma das lideranças a lutar contra instalação de terminal de minério no distrito.

Saneamento e monitoramento

A luta pela preservação e descontaminação do Rio Itabirito tem mostrado resultados promissores nos últimos anos, graças também aos esforços do SAAE. Com um sistema robusto de tratamento de esgoto, a qualidade da água do rio e seus afluentes tem melhorado, beneficiando tanto o meio ambiente quanto a saúde pública. Um dos pontos de destaque é a localização estratégica dos pontos de captação do SAAE, situados a montante de qualquer ponto de lançamento de efluentes. Isso garante que a água captada esteja livre de contaminações diretas, permitindo um tratamento mais eficiente e seguro.

Desde 2013, quando a primeira Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) entrou em operação, o sistema de coleta e tratamento de esgoto da cidade tem se expandido e se aprimorado. Atualmente, 90% do esgoto gerado na sede urbana é coletado, e 79% desse esgoto recebe tratamento adequado. A eficiência na remoção de carga orgânica alcança cerca de 95%, um índice considerado exemplar.

Atualmente, 90% do esgoto gerado na sede urbana é coletado, e 79% desse esgoto recebe tratamento adequado.

O financiamento para a instalação, operação e manutenção desse sistema veio de recursos do governo federal, o que permitiu ao SAAE implementar tecnologias avançadas e garantir a operação contínua das ETEs. Os resultados já são visíveis em diversos pontos da cidade, onde a qualidade da água do Rio Itabirito e seus afluentes mostra sinais claros de recuperação, especialmente em relação à contaminação por efluentes domésticos.

Apesar dos avanços, ainda há desafios a serem superados. Existem áreas que ainda não estão plenamente integradas ao sistema de tratamento de esgoto. Para enfrentar essa questão, o SAAE realizou um diagnóstico detalhado da situação atual e está na fase de elaboração de projetos para a ampliação do sistema de coleta e tratamento. “O nosso trabalho é contínuo e progressivo. Estamos sempre buscando formas de ampliar a cobertura do sistema de esgoto e melhorar ainda mais a qualidade das águas do Rio Itabirito”, afirmou Heloísa França.

A questão da turbidez do Rio Itabirito é central para o Subcomitê. O grupo possui um sistema de monitoramento articulado, que emite alertas a qualquer alteração na qualidade da água. Este trabalho é crucial para manter a saúde do ecossistema local e garantir o abastecimento de água de qualidade para a população. Odilon de Lima, membro do Subcomitê e da Associação Águas do Acuruí, está à frente desse monitoramento. “Todos os meses eu colho amostras de água do rio e mando para análise, que é realizada pelo Projeto Manuelzão”, diz. Segundo ele, sempre que há alguma denúncia de irregularidade no meio ambiente, a demanda é encaminhada imediatamente ao Subcomitê, que leva ao conhecimento da Secretaria de Meio Ambiente de Itabirito, para que sejam tomadas as devidas providências.

Hoje secretária-adjunta do CBH Rio das Velhas, Heloísa França tem longa história de atuação no Subcomitê. “Amigo do rio”, Odilon de Lima promove mensalmente coleta de amostras do curso d’água.

Ações sustentáveis

Outro destaque é o Programa de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) de Itabirito, uma iniciativa que tem gerado resultados positivos na conservação ambiental na sub-bacia do Ribeirão Carioca, afluente do Rio Itabirito. Impulsionado pelo CBH Rio das Velhas, o programa promove a recuperação de áreas e remunera o produtor rural pelos serviços ecossistêmicos que ele gera à coletividade. De acordo com o secretário municipal de Meio Ambiente e coordenador do Subcomitê Rio Itabirito, Frederico Leite, “o PSA foi um programa inovador na região do Alto Velhas. O município de Itabirito criou as bases legais, com fundo próprio e transparência nas ações com a criação de Unidades Gestoras dos Programas (UGPs), para definir ações e fiscalizar os resultados dos investimentos feitos. Até o momento mais de 90 hectares foram recuperados e protegidos, beneficiando mais de 20 produtores rurais na sub-bacia do Ribeirão Carioca”.

Microbacia do Ribeirão Carioca é o foco do programa de PSA em Itabirito.

O sucesso das políticas de PSA tem feito o modelo de Itabirito servir de referência para outros municípios na bacia do Rio das Velhas, e até fora de Minas Gerais.

Além disso, a prefeitura de Itabirito desenvolve várias ações sustentáveis, com o apoio do Subcomitê, que visam a preservação ambiental e a melhoria da qualidade de vida dos habitantes. Um dos destaques é a Virada Ambiental, ação da Secretaria Municipal de Meio Ambiente, em conjunto com outras secretarias, autarquias, organizações sociais e setor privado para o plantio de mais de mil mudas de ipês em um único dia. Para este ano a Virada Ambiental deverá escolher uma espécie nativa da Mata Atlântica para repetir o ato, no dia 13 de dezembro. “Estamos avançando na criação de mais dois parques urbanos: a Floresta Municipal Grota da Mina e o Parque Linear do Rio Itabirito. Esse último possibilitará a proteção e uso sustentável das margens do Rio Itabirito, desde o início da confluência do Ribeirão Mata Porcos e o Ribeirão Sardinha, até a sua foz no Rio das Velhas. Além desses, destacamos o Plano de Ação Climática e o Plano da Mata Atlântica, ambos já em andamento e alinhados com políticas brasileiras e mundiais em relação à agenda de adaptação climática e proteção a biodiversidade”, informa o secretário.

Programa de Pagamento por Serviços Ambientais tem remunerado proprietários rurais pelo bem ecossistêmico gerado à sociedade. Propriedade do pecuarista Ailton Faria foi cercada e recebeu o plantio de 1,7 mil mudas de espécies nativas.

Desafios e parcerias

A represa Rio de Pedras, o único barramento no leito do Rio das Velhas, é um ponto estratégico para o abastecimento da RMBH. A sua gestão e preservação são cruciais para a segurança hídrica da região. O distrito de Acuruí, embora pertencente à UTE Nascentes, é ativo nas discussões e ações do Subcomitê Rio Itabirito, reforçando a colaboração regional.

A represa já foi muito importante para a geração de energia elétrica, mas há alguns anos, devido ao assoreamento, o volume de água diminuiu muito e prejudicou significativamente essa atividade. Importante para manter a vazão do Rio das Velhas no período de seca, a represa também contribui para evitar inundações ao longo do rio no período das chuvas. Importante para o turismo local, o reservatório possibilita a realização de diversas provas esportivas e atividades náuticas.

De acordo com Raul Damásio, membro do Subcomitê Nascentes, “o assoreamento é certamente o principal problema dessa represa. Calcula-se que cerca de 80% do volume da represa esteja ocupado com resíduos sólidos provenientes de atividades de mineração e também das muitas voçorocas que são comuns neste território. Outros problemas são a falta de tratamento de esgoto em comunidades banhadas por afluentes do Rio das Velhas, como o Ribeirão Maracujá, que leva praticamente todo o esgoto do distrito de Cachoeira do Campo para o Rio das Velhas e, consequentemente, para a represa Rio de Pedras. Mais recentemente temos visto uma ocupação crescente das áreas do entorno da represa, fato este que certamente trará consequências negativas para a represa, principalmente no que se refere à qualidade das águas. O sonho das comunidades locais é que a represa seja recuperada”.

Membro do Subcomitê Nascentes, Raul Damásio chama a atenção para estado avançado de assoreamento da barragem Rio de Pedras (acima).

 


Assessoria de Comunicação do CBH Rio das Velhas:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
Texto: Mariana Martins