
“O desenvolvimento da Educação Ambiental no Brasil, seja no plano institucional, seja no tocante às formulações teóricas, está intrinsecamente ligado ao fortalecimento das organizações que atuam na sociedade civil.” A avaliação é dos pesquisadores Carlos Loureiro, professor titular da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e Felipe de Lima, mestre em Educação pela mesma universidade.
Maria Teresa Corujo, pedagoga com especialização em Educação Ambiental (EA), conselheira do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas (CBH Rio das Velhas), coordenadora do Subcomitê Águas do Gandarela e ambientalista ativa, diz que a EA que praticam na região “é uma das estratégias para sensibilizar”, e tem uma particularidade: “um tipo de atuação um pouco diferente de outras iniciativas que não estão diretamente vinculadas à defesa de um dado território”.
Na Feira do Meio Ambiente de Caeté, o Movimento Artístico, Cultural e Ambiental de Caeté (MACACA), ONG da qual faz parte, levou ao estande de exposição a “preguiça gigante inflável e banners” para alertar os visitantes sobre os riscos que corre a Serra do Gandarela, que hospeda, dentre inúmeras riquezas naturais, uma paleotoca que já foi habitada por esse enorme animal de dois dedos, exemplar da megafauna extinta, cuja cavidade “a Vale tentou dinamitar”, assinala Corujo.
É preciso “dar visibilidade a esse patrimônio”, acrescenta, e destaca que “a questão das águas é decisiva” na Serra. “A gente leva essa informação com vídeos, boletins, redes sociais, eventos com teatro e música, rodas de conversa, datashow nas paredes, atividades nas praças, Feira da Afonso Pena, oficinas de argila com as crianças, uma Educação Ambiental mais livre, que não é engessada em formatos”.
Representando o movimento ‘MACACA’, Maria Teresa Corujo participou da Feira do Meio Ambiente de Caeté
Asas para voar
Descendo o rio, já no Médio-Alto Velhas, está outra joia que clama por preservação: a região do Carste. Ali, uma sintonia perfeita entre Subcomitê, CBH Rio das Velhas, universidade e redes públicas de educação mobilizou durante quatro anos uma ação de Educação Ambiental que fez história e ainda inspira novas ousadias.
Quem conta a história é Derza Nogueira, gestora ambiental e então integrante da equipe de Mobilização e Educação Ambiental do CBH Rio das Velhas, atualmente vice-presidente da ONG Pé de Urucum. “A partir de estudo sobre o Carste, suas lagoas e as aves migratórias, desenvolvido pelo professor José Eugênio Côrtes Figueira, do Departamento de Ecologia da UFMG [Universidade Federal de Minas Gerais], e por sua então orientanda de doutorado Paula Nóbrega, nascia o projeto Asas do Carste”, explica.
Com a participação de representantes de todos os seis municípios da Unidade Territorial Estratégica (UTE) Carste, foram mapeadas escolas estaduais e municipais localizadas nas proximidades de lagoas da região, de modo a permitir o deslocamento dos alunos a pé, despertando pertencimento sobre o patrimônio natural.
A partir daí, baseados na metodologia da doutoranda Nóbrega, os próprios estudantes passaram a observar as aves, após capacitação geral. Munida de binóculos e máquinas fotográficas, a turma prosseguiu com a catalogação visitando as lagoas em todas as estações do ano.
O final do projeto foi coroado com a publicação de cinco mil exemplares de um álbum com figurinhas autocolantes estampando as fotografias feitas pelas meninas e pelos meninos. A peça foi distribuída aos alunos de escolas estaduais e municipais. Para fazer jus às figurinhas, cada candidato tinha que cumprir atividades pedagógicas de Educação Ambiental. Sucesso total!
José de Castro Procópio, membro do Subcomitê Ribeirão da Mata e presidente do Instituto Guaicuy, acompanhou de perto o Asas: “A ideia era fazer o aluno e a escola olharem pela janela, verem seu entorno, o meio em que vivem”. Para ele, a Educação Ambiental “só vai acontecer se houver algo sistêmico nas novas gerações”.
Derza Nogueira vê pelo mesmo prisma: “Educação Ambiental não é um termo que a gente pegue e fale: ‘temos que preservar essas aves e as lagoas’. É preciso trabalhar o assunto, tem que ir lá, ver a qualidade de água, a ocupação do entorno, a vegetação, as cercas, os resíduos, conhecer o território e ver o que ele precisa”.
Expedição Paraúna
Já no Médio-Baixo Rio das Velhas, no município de Gouveia, a ONG Caminhos da Serra conduz uma série de projetos de Educação Ambiental. Um deles, detalha Alex Mendes Santos, diretor da ONG, engloba acolhimento e reabilitação de animais silvestres vítimas do tráfico, atropelados ou recolhidos pela polícia ambiental, com vários desdobramentos pedagógicos, como visitação das escolas, informações sobre legislação de proteção e sobre cuidados. A Brigada Florestal mantida pela organização também desenvolve ações educativas nas visitas às comunidades rurais, quando presta orientações sobre manejo responsável e outras formas de prevenção a incêndios florestais.
De quatro em quatro anos, o grande evento de mobilização e educação é a expedição pelo vigoroso Rio Paraúna. Da nascente à foz, a jornada é cumprida parte em caminhadas, parte por automóveis e parte por via fluvial. Parando nas comunidades, a caravana capricha na comunicação e em ricas prosas com os ribeirinhos. Biomonitoramento feito pela ONG completa as atividades, que chamam a atenção e atraem a população.
Educação Ambiental é o foco da ‘Caminhos da Serra’
Licença para entrar no rio
Maria Teresa Corujo, com sua longa trajetória de ativismo, fala “agora como pedagoga”: “É preciso mudar os alicerces da EA. Ela não pode ser embalada num conteúdo formal. Sócrates não ficava numa sala de aula. Saía andando com os alunos pelas ruas de Atenas, abordando pessoas para discutir filosofia e, em especial, questionando a natureza da verdade. Há que saber o que as pessoas sentem nesse lugar, nessa bacia, nessa água”.
E arremata: “É preciso envolvimento, sensibilidade, como os povos indígenas fazem, ‘eu sou parte dessa natureza, peço licença para entrar no rio’. Não esse repeteco de uma educação equivocada, ela tem que ser crítica, sistêmica no tempo e no espaço”.
Os estudiosos lá de cima dessa matéria, Loureiro e Lima, concordam: “É uma opção compreender a EA desvinculada das grandes lutas sociais e da recusa aos padrões de acumulação econômica”. Também é uma opção cultivar tais vínculos, permitem concluir.
Assessoria de Comunicação do CBH Rio das Velhas:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
*Texto: Paulo Barcala
*Fotos: Michelle Parron; Arthur de Viveiros; Divulgação