Há poucos quilômetros da capital do estado está a região do Carste, berço da história das ciências naturais do país
No Vetor Norte de Belo Horizonte, encontra-se uma das regiões brasileiras mais emblemáticas e ricas em termos de paisagem cárstica e da história das ciências naturais do país: o Carste,que já foi palco do desbravamento do território brasileiro na época dos bandeirantes e cenário de importantes descobertas arqueológicas até os dias atuais.
Por definição, Carste é um tipo de relevo formado pelo efeito corrosivo das águas sobre rochas. É uma área muito frágil que apresenta dois sistemas de funcionamento: o superficial – que dá origem a sumidouros, dolinas, vales cegos e maciços calcários – e o subterrâneo – que proporciona a formação de grutas, galerias e ao sistema de drenagem subterrâneo, que é alimentado pelos sumidouros.
“A região do Carste possui uma beleza particular e única pela exuberância dos afloramentos calcários, bem como dos tesouros escondidos em seu interior, como os achados arqueológicos e paleontológicos, e formações espeleológicas que essas rochas armazenam e que ainda são pouco conhecidas pelos moradores da região. Além dessas belezas guardadas em seu interior, possui ainda uma característica de armazenamento de água em razão da dissolução e porosidade das rochas carbonáticas, formando assim um relevo, que além de belo, é importantíssimo para o abastecimento de água, tanto do sistema hídrico subterrâneo, quanto do sistema hídrico superficial. Por essas características, o relevo cárstico exige cuidados especiais”, explicou José Duarte, coordenador do Subcomitê Carste, vinculado ao Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas (CBH Rio das Velhas).
Esse tipo de relevo é encontrado em outras partes do país e do mundo. O carste mineiro, e que é banhado pelo Rio das Velhas, compreende os municípios de Lagoa Santa, Confins, Pedro Leopoldo, Matozinhos, Funilândia e Prudente de Morais. Rica em história, que perpassa a formação e ocupação do estado de Minas Gerais e do Brasil, a região do Carste também se destaca pelas belezas naturais e formação geológica peculiar.
Devido às características naturais, o Carste chama a atenção pelo seu potencial turístico com possibilidades de práticas de ecoturismo e turismo histórico. Porém, Duarte explica que tudo isso ainda é pouco explorado no local. “Percebe-se um baixo valor turístico atribuído à região pela falta de conhecimento e de senso de pertencimento em valorizar aquilo que está no “quintal de casa”. A proposta do Subcomitê Carste é de abrir caminho para um diálogo com o poder público, sociedade civil e setor produtivo para construirmos um programa de desenvolvimento do potencial turístico da região”, ressaltou.
Vulnerabilidade cárstica
Segundo o Plano Diretor de Recursos Hídricos (PDRH) do CBH Rio das Velhas, os principais agentes de degradação das águas superficiais da sub-bacia cárstica devem-se, sobretudo, ao aporte de cargas difusas que são relacionadas às atividades de agropecuária, que favorecem os processos erosivos devido à remoção da cobertura vegetal. Além disso, o lançamento de esgotos domésticos e de efluentes industriais.
De acordo com o estudo, a sub-bacia conta com a captação de água subterrânea para o abastecimento de 100% dos municípios de Funilândia, Lagoa Santa e Matozinhos, os quais também possuem o serviço de tratamento de água. Inclusive, no espectro do Rio das Velhas, a unidade é a sexta maior com índice de tratamento de esgoto entre as sub-bacias da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas.
Na Unidade Territorial Estratégica (UTE) do Carste, entre os anos de 2013 e 2018, o CBH Rio das Velhas elaborou os Planos Municipais de Saneamento Básico (PMSB) de Funilândia, Pedro Leopoldo, Prudente de Morais e Confins, para garantir uma melhor gestão dos recursos hídricos da região.
De acordo com o coordenador do Subcomitê Carste, o saneamento básico na localidade é uma questão primordial para a conservação dos recursos hídricos, dada a fragilidade do sistema cárstico e a vulnerabilidade à contaminação dos sistemas hídricos superficiais e subterrâneos. Ele completa afirmando que há grande parte da população urbana sem acesso à rede de esgoto em alguns municípios e outros que resistem em interligar seus esgotos à rede coletora.
Outro grande impacto na região é o desenvolvimento e a consequente expansão urbana do Vetor Norte de Belo Horizonte nos últimos anos. “A expansão urbana sem um planejamento adequado traz impactos irreversíveis para a região, como a extinção de manchas verdes que poderiam ser preservadas e a ocupação de áreas às margens de curso d’água. Além disso, vê-se a criação de condomínios em áreas mais afastadas dos centros urbanos, que deixam o saneamento básico à deriva”, destacou Duarte.
Um lugar de tesouros escondidos
Respiração abafada, olhos cerrados e caminhos estreitos são as experiências de quem decide desbravar as grutas da região. A Gruta da Lapinha é um dos destinos mais conhecidos da localidade e que não pode ficar de fora do roteiro de quem por lá passa – isso porque a Lapinha foi eleita como uma das “Sete Maravilhas da Estrada Real”. A gruta é um maciço calcário formado há cerca de 600 milhões de anos pelos restos de fundo de mar que cobria toda a região.
A Gruta da Lapinha é um dos atrativos do Parque Estadual do Sumidouro, uma unidade de conservação situada nos municípios de Lagoa Santa e Pedro Leopoldo. O parque também abriga pinturas rupestres de milhares de anos e sítio arqueológico de importância mundial escavado por Peter Lund. Também tem trilhas, a Casa Fernão Dias e a vila da Quinta do Sumidouro.
Outra curiosidade da região é o Parque Estadual Cerca Grande, localizado no distrito de Mocambeiro, no município de Matozinhos. O lugar também abriga importantes e expressivos sítios arqueológicos do Brasil. A Lapa da Cerca Grande é um verdadeiro patrimônio e tem importante papel nas ciências mundiais desde quando foi descrita pela primeira vez por Peter Lund, em 1835.
O parque tem como objetivos a preservação de ecossistemas naturais de grande relevância ecológica e beleza cênica, possibilitando a realização de pesquisas científica e o desenvolvimento de atividades de educação ambiental. A unidade ainda não está aberta à visitação ao público em geral, apenas para pesquisa e intuitos educacionais.
Em novembro do ano passado, o CBH Rio das Velhas realizou uma visita técnica a este belo e rico cenário durante a programação do 9º Encontro de Subcomitês, que acontece anualmente.
Na região há muitas outras belezas e encantos existentes, como a Gruta do Ballet, Lapa do Santo, Monumento Natural Vargem da Pedra, Monumento Natural da Jaguara, Lagoa Central em Lagoa Santa, Surgências e Sumidouros, e tantas outras manifestações culturais e artísticas, como a Igreja Nossa Senhora da Conceição, construída por Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho, no fim do século 18, sendo considerada a única obra completa executada pelo mestre.
Rede Asas do Carste
O “Rede Asas do Carste”, desenvolvido desde 2015 nos municípios da sub-bacia do Carste, é um dos projetos mais importantes e conhecidos por todos da região. A iniciativa tem como proposta desenvolver, com professores e alunos da rede municipal e estadual, que estão instaladas próximas às lagoas cársticas, atividades de campo para monitoramento e observação de aves no ambiente local para que, assim, entendam o contexto em que vivem.
Para o projeto definiram as aves aquáticas como bioindicadores, pois o aumento ou decréscimo das populações de aves aquáticas pode ser usado como indicador sobre os ciclos das lagoas cársticas e de suas condições ambientais.
Entre 2015 e 2018, 104 espécies de aves do entorno das lagoas da região cárstica de Lagoa Santa foram identificadas e fotografadas por alunos das escolas dos municípios. A ação envolveu mais de 150 alunos de nove escolas, e todo o acervo adquirido resultou-se em um álbum de figurinhas, com o objetivo de que seja uma nova forma de incentivo à multiplicação da proposta pedagógica de envolver as escolas nas questões de pertencimento do território.
Assessoria de Comunicação CBH Rio das Velhas:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
*Texto: Ohana Padilha
*Fotos: Bianca Aun, Fernando Piancastelli e Ohana Padilha