O ano nem bem começou e a chuva já faz estragos em Belo Horizonte. Os casos de alagamentos, destruição e desabamentos são eventos recorrentes e catastróficos, que causam pânico, custam vidas e trazem transtornos de todo tipo. Ano após ano a história se repete e o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas (CBH Rio das Velhas) alerta para o modelo de urbanização que não considera os cursos d’água.
O temporal que atingiu a capital mineira na tarde desta quarta-feira (06) deixou pessoas ilhadas na região Centro-Sul, que recebeu 50,2 milímetros de chuva. Carros foram arrastados e parte do asfalto arrancado pela força da água no bairro Belvedere. No bairro Cidade Jardim, a Avenida Prudente de Moraes foi bloqueada por causa do risco de transbordamento do Córrego Leitão. No bairro São Bento, também na Região Centro-Sul, a Rua Kepler, uma das mais importantes do bairro, se transformou em um “rio”. Na Avenida Cônsul Antônio Carlos, um carro foi arrastado e, pouco depois, o volume de água diminuiu e a motorista foi resgatada por um policial militar.
O Ribeirão Onça, nas proximidades do bairro Ribeiro de Abreu, região Nordeste de Belo Horizonte, viu nascer uma “cachoeira”. A região, que costuma sofrer com alagamentos, assistiu às ruas e avenidas se transformarem em rios e, um declive que há na região, se tornou uma queda d’água.
Também houve registro de alagamentos nas regiões Oeste, Noroeste e Venda Nova, além de Contagem, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH). A Avenida Tereza Cristina, principal acesso às regiões Oeste e Barreiro, chegou a ficar bloqueada pelo risco de transbordamento dos córregos Ferrugem e Ribeirão Arrudas.
De acordo com a Defesa Civil, o ar quente e úmido vai predominar sobre Minas Gerais nos próximos dias mantendo as condições para a formação de mais nuvens carregadas sobre quase todas as regiões do Estado. A previsão para os próximos dias é de mais pancadas de chuva sobre a Grande BH e muitas outras áreas de Minas Gerais, havendo risco de transbordamento de córregos e rios.
O vice-presidente do CBH Rio das Velhas, Renato Júnio Constâncio, explica que as chuvas evidenciam a fragilidade da gestão das águas urbanas. “As fortes chuvas em Belo Horizonte nos mostram as mazelas do modelo de urbanização que ‘envelopam’ as águas urbanas. Um modelo difícil de se reverter e que a cada ano evidencia o problema de drenagem urbana”.
Para evitar as enchentes e inundações é preciso atentar para a necessidade de permeabilização das cidades. Ou seja, é preciso assegurar que a água da chuva passe pelo solo e seja absorvida – e não se acumule na superfície. O vice-presidente do CBH Rio das Velhas esclarece também que “não se deve descuidar, ainda, da manutenção das bacias de rios, da recuperação de matas ciliares (vegetação às margens de rios) e da implementação de políticas urbanas que leva em consideração a gestão das águas urbanas”, finalizou Renato Constâncio.
Solução tem foco na drenagem
Medidas para minimizar estragos causados pelas chuvas na Grande BH não dependem apenas de verbas bilionárias e poderiam ser tomadas pelo poder público há anos. A análise é do arquiteto e urbanista Sergio Myssior, que aponta ações viáveis em curto e médio prazo para reduzir problemas causados todos os anos para milhares de moradores da capital e cidades vizinhas.
Sérgio Myssior lembra que vários estudos sobre impactos causados por eventos climáticos foram contratados pelas prefeituras nos últimos anos. “Em 2016, a Prefeitura de BH contratou um estudo sobre a vulnerabilidade aos efeitos das mudanças climáticas. Essa pesquisa indicou um cenário preocupante imediato e projeta para 2030 que 80% dos bairros da capital serão classificados como de alto risco, com problemas de inundações, deslizamentos, aumento de doenças como dengue e chikungunya, e ilhas de calor”, afirma. Outro levantamento sobre o saneamento da capital indica 80 pontos de alagamentos que já são muito bem conhecidos.
Segundo o urbanista, as ações emergenciais tomadas nas últimas décadas para reduzir os problemas com as chuvas se mostram cada vez mais custosas aos cofres públicos e pouco efetivas. Por isso ele aponta medidas de menor impacto com resultados melhores para os problemas de drenagem. “Vejo agora o risco de que o poder público repete um modelo esgotado. Quando se vê diante da emergência, tenta alargar canais e criar piscinões, além das canalizações já realizadas. São medidas onerosas e que não atacam o problema em sua raiz. As cidades que enfrentam essa questão de forma mais exitosa apostam em corredores ecológicos, parques e áreas verdes para favorecer a drenagem”, explica. Ele cita como um exemplo bem-sucedido as cidades de Curitiba, no Paraná e de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul.
Para Myssior, o uso de parques e áreas naturais como pontos de drenagem da água é uma das possibilidades. “BH tem mais de 70 parques, que podem ser usados melhorar a capacidade de drenagem e retenção dessa água de chuva. As áreas de lazer podem se transformar em piscinas durante a chuva, como bacias de acumulação para retardar a dispersão dessa água”, sugere.
Outra alternativa citada pelo urbanista é criar, nos prédios, caixas de retenção e retardo, que podem ficar no subsolo para se encherem durante as chuvas. “Há ainda a urgência na habitação de interesse social, que não existe e gera um déficit enorme. Assim, áreas de risco são ocupadas, como tem acontecido em todo estado”, esclarece.
“O que BH precisa é de programas e projetos de estado e não de governo, pois o que está faltando é dar continuidade as ações. Além disso, a população precisa demandar e acompanhar o que o poder público realizada. Os Comitês de Bacia são um bom exemplo de organização composta pela sociedade civil, usuários de água e poder público que demanda, cobra e luta pela melhoria ambiental da bacia e que pode contribuir para a uma transformação urbana”, finalizou Sérgio Myssior.
Assessoria de Comunicação CBH Rio das Velhas:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
*Texto: Luiza Baggio