Por que o Onça ainda é poluído?

14/07/2020 - 13:10

Quem nunca ouviu as histórias de pessoas que nadavam nos rios urbanos? As cidades nasceram e cresceram no entorno dos cursos d’água. No princípio da ocupação, as pessoas procuravam se instalar próximo às margens porque dependiam da água para uma série de atividades. Com a expansão das cidades, as águas foram contaminadas, especialmente pelo lançamento de lixo e esgoto. E, em muitos casos, o rio, que era local de vida, foi canalizado e sumiu da paisagem. É o caso do Ribeirão Onça, que atravessa boa parte da cidade de Belo Horizonte, na região de maior população da bacia do Rio das Velhas.

No território do Ribeirão Onça é possível encontrar propriedades rurais, complexos industriais, grandes investimentos imobiliários e ocupações de comunidades tradicionais – como o Quilombo de Mangueiras, ocupação Cigana e ocupação Dandara. Assim, a região se caracteriza por uma grande diversidade social, ocupacional e ambiental.

Em questões de saneamento básico, a Bacia do Ribeirão Onça sofre com o lançamento de esgotos domésticos e de efluentes industriais em seu curso. O Onça junto com o Ribeirão Arrudas são os afluentes do Rio das Velhas que concentram o maior problema da poluição hídrica, proveniente da região metropolitana de Belo Horizonte.

Investimento em saneamento básico é uma demanda dos moradores, principalmente do São Gabriel e do Ribeiro de Abreu. Nesses bairros, o Ribeirão Onça é praticamente um esgoto a céu aberto. “Nós reivindicamos há vários anos a limpeza do ribeirão, pedindo providência para fazer o saneamento. Sabemos que vai demandar muito dinheiro, mas é um problema que atinge a todos os moradores nas questões de higiene, saúde e urbanização “, disse o presidente da Associação Comunitária do bairro Ouro Minas, Gilmar Barbosa dos Santos.

Para reduzir a poluição, em 2006, foi construída a Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) Onça que realiza o tratamento de efluentes em nível secundário desde o ano de 2009. Responsável por tratar os esgotos domésticos oriundos da Bacia do Ribeirão Onça, contemplando os municípios de Contagem e Belo Horizonte, a estação possui capacidade para o tratamento de 1.800l/s. A Copasa (Companhia de Saneamento de Minas Gerais) informa que trata 100% do esgoto encaminhado à ETE Onça.

Contudo, para a moradora do Baixo Onça, Maria Luisa Lelis Moreira, psicóloga social e ambiental que integra o Movimento Deixem Onça Beber Água Limpa e é conselheira do Subcomitê Ribeirão Onça e do CBH Rio das Velhas, o desafio é que o esgoto tem que ser coletado e tratado em sua totalidade. “O maior desafio é interceptar, coletar e tratar 100% do esgoto da bacia do Ribeirão Onça. Apesar da Copasa interceptar 95% do esgoto e tratar 100% do que coleta o que vemos no Onça é um esgoto a céu aberto. A ETE Onça trouxe grandes avanços para o saneamento na bacia, mas ela ainda não atingiu a sua plenitude e ainda temos muito o que melhorar”, afirmou.

Nós reivindicamos há vários anos a limpeza do ribeirão, pedindo providência para fazer o saneamento. Sabemos que vai demandar muito dinheiro, mas é um problema que atinge a todos os moradores nas questões de higiene, saúde e urbanização." Gilmar Barbosa dos Santos Presidente da Associação Comunitária do bairro Ouro Minas

O movimento “Deixem o Onça Beber Água Limpa” lançou este ano a Meta 2025 de Pescar, Nadar e Brincar no Onça. Para isso, o movimento prevê ações como: 1) 100% de interceptação e captação de esgoto do Ribeirão Onça, recuperação das margens e proteção das nascentes; 2) Construção do novo acesso ao bairro Ribeiro de Abreu e região para possibilitar e melhorar o trânsito entre os bairros circundados pelo Ribeirão; 3) Municipalização da MG-20; 4) Construção do Parque Ecológico Ciliar do Ribeirão Onça; e 5) Implementação do Plano de Relocalização de famílias e negócios inseridos nas manchas de inundação do Ribeirão Onça.

Questionada sobre a qualidade dos efluentes tratados na ETE, a companhia esclarece que o tratamento atende aos padrões estabelecidos na Deliberação Normativa Conjunta COPAM/CERH-MG Nº01 de 2008, com uma eficiência média de 82% em remoção de matéria orgânica (dados do primeiro semestre de 2020). “A Copasa informa que o DBO do esgoto que chega na ETE Onça é de 199,8 mg/l, e o DBO do esgoto após o tratamento é de 35,29 mg/l. Ou seja, a eficiência de remoção é de 82,30%”, informa a Companhia por meio de nota.

Ainda de acordo com a Copasa, o lançamento de efluentes tratados no Ribeirão Onça não produz impactos significativos, tendo em vista sua condição previamente deteriorada. “Considerando sua curta extensão e o breve tempo de percurso do escoamento em seu canal, a capacidade auto depurativa do Onça não atinge todo o seu potencial até a confluência com o Rio das Velhas. Vale destacar, por outro lado, que o encontro das águas do Ribeirão Onça e do Rio das Velhas minimiza os eventuais efeitos do lançamento, uma vez que este último curso d’água apresenta elevada capacidade de diluição e potencializa o processo de autodepuração. Observa-se, pelos resultados obtidos, que não há impacto significativo no aumento das concentrações de DBO [Demanda Bioquímica de Oxigênio]e, por conseguinte, não são verificados teores de OD inferiores ao Padrão de Classe 3 em nenhum ponto do trecho simulado do Rio das Velhas”, finaliza a nota.

O Ribeirão Onça, em seu encontro com o Rio das Velhas, em Santa Luzia

Tratamento terciário

Para o presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas, Marcus Vinícius Polignano, um passo importante para a melhora da qualidade das águas quem saem da estação e chegam depois ao Rio das Velhas é o tratamento terciário. “Precisamos avançar e implantar o tratamento terciário na ETE Onça. O que ocorre atualmente é um tratamento limitado. Para melhorar a qualidade da água é preciso também retirar o excesso de nutrientes e reduzir ainda mais os coliformes. A falta de um tratamento terciário dos esgotos que elimina os micro-organismos faz com que a água não atinja as metas estipuladas de qualidade.Os dados mostram que existe aumento de nutrientes e eutrofização o que inviabiliza a utilização da água em quase 300 km de extensão do curso d’água [Rio das Velhas], implicando em uma restrição de uso. Não podemos inviabilizar um rio pela falta de tratamento de esgoto”, afirma Polignano, que acredita também ser importante ampliar a capacidade de tratamento na ETE Onça.

O tratamento terciário de efluentes consiste em técnicas físico-químicas ou biológicas para a retirada de poluentes específicos que não foram retirados pelos outros processos mais comuns. A técnica retira as impurezas da água que, após tratada, volta para a bacia.

Estação de Tratamento de Esgoto do Ribeirão do Onça

No entanto, a Copasa esclarece que, “a implantação de um tratamento terciário pontual na ETE Onça, quando ainda há a necessidade de uma maior abrangência do tratamento de esgoto no Estado de Minas Gerais, requer uma avaliação mais profunda, não sendo neste momento objeto de estudo”.

O presidente do CBH Rio das Velhas explica também que o novo marco regulatório do saneamento básico, aprovado pelo Senado em junho deste ano, estabelece metas para a universalização do serviço. “De acordo com o marco regulatório, as empresas responsáveis pelo saneamento deverão se comprometer com metas de universalização a serem cumpridas até o fim de 2033”.

Polignano diz ainda que para que o Rio das Velhas ganhe uma nova vida é importante o empenho de todos: poder público, empresários e comunidades. “Afinal, a água do rio serve a todos por onde passa e significa vida para as comunidades e muita biodiversidade”.


Veja fotos da bacia hidrográfica do Ribeirão Onça:


Assessoria de Comunicação CBH Rio das Velhas:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
*Texto: Luiza Baggio