As grossas portas se abrem e conduzem a um mundo ao mesmo tempo forte e suave – imerso em fé em estado absoluto e que transmite calma. Conhecer o Mosteiro de Nossa Senhora da Conceição de Macaúbas, localizado em Santa Luzia, a poucos metros da calha do Rio das Velhas, é uma experiência única. Ali encontram-se 13 freiras que vivem em clausura, roseiras que servem de matéria-prima para um vinho famoso, além de uma nascente, chamada de Mãe D’água, que abastece o Mosteiro e os moradores dos arredores.
A simpática abadessa Maria Imaculada Jesus Hóstia, de 80 anos, 63 deles em Macaúbas, recebeu a equipe de comunicação do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas (CBH Rio das Velhas) no locutório do Mosteiro, acompanhada de sua irmã de sangue, a vice-madre Maria Auxiliadora. Através de uma densa treliça de madeira, a madre contou histórias e falou sobre a importância de se preservar o Rio das Velhas.
“Temos na área do Mosteiro a nascente Mãe D’água que é uma benção de Deus. Nunca ficamos sem água, apesar da situação crítica de alguns cursos d’água da nossa região, como por exemplo o Córrego Macaúbas, que já secou em época de estiagem, e o Rio Vermelho que já ficou quase sem água. Nós temos a responsabilidade de não deixar as pessoas mexerem na natureza e aqui no Mosteiro levamos essa premissa a sério. Nunca deixei cortar uma árvore aqui. Da porta do Mosteiro é possível contemplar a paisagem contornada pelo Rio das Velhas que é uma obra de Deus. É função de todos ajudar a preservá-lo,”, conta a madre Maria Imaculada.
Ela também destacou que encomendou um estudo sobre a qualidade da água que brota no local. “Mandei analisar a qualidade da água da nascente Mãe D’água que, apesar de ser calcária, não faz mal a saúde”, explica Maria Imaculada.
A abadessa Maria Imaculada Jesus Hóstia e sua irmã de sangue, a vice-madre Maria Auxiliadora recebem a equipe de comunicação do CBH Rio das Velhas. Em entrevista, a abadessa destaca a importância do curso d’água. Crédito: Fernando Piancastelli.
História
Na entrada principal do Mosteiro, onde encontra-se uma placa escrita “clausura”, vê-se em destaque a pintura de um personagem fundamental na história do Mosteiro: o eremita Félix da Costa, que veio da cidade de Penedo (AL), em 1708, pelo Rio São Francisco, passando pelo Rio das Velhas, na companhia de irmãos e sobrinhos.
Ele demorou três anos para chegar a Santa Luzia, onde construiu uma capela dedicada a Nossa Senhora da Conceição, de quem era devoto. Mas, antes disso, bem no encontro das águas do Velho Chico com o Rio das Velhas, em Barra do Guaicuí, distrito de Várzea da Palma, ele teve a visão de um monge com hábito branco, escapulário, manto azul e chapéu caído nas costas. “Ele se viu ali. Foi o ponto de partida para a fundação do Recolhimento de Macaúbas”, conta a madre superiora Maria Imaculada de Jesus Hóstia. No entanto, a capelinha erguida por Félix da Costa não existe mais.
A abadessa conta ainda que Félix da Costa seguiu, em 1712, para o Rio de Janeiro e obteve do bispo dom frei Francisco de Sá e São Jerônimo – na época ainda não havia a diocese de Mariana, a primeira de Minas – licença para usar hábito e pedir esmola. Mais tarde, recebeu autorização para abrir o recolhimento feminino em Santa Luzia.
Recolhimento
No século XVIII, quando as ordens religiosas estavam proibidas de se instalar nas regiões de mineração por ordem da coroa portuguesa, para que o ouro e os diamantes não fossem desviados para a Igreja, havia apenas dois recolhimentos femininos em Minas: o de Macaúbas e um em Chapada do Norte, no Vale do Jequitinhonha.
Conforme os estudos, tais espaços recebiam mulheres de várias origens, as quais podiam solicitar reclusão definitiva ou passageira. A madre superiora explica que havia, portanto, uma complexidade e diversidade de tipos de reclusas, devido à falta de estabelecimentos específicos para suprir as necessidades delas. “Nessa época, o Mosteiro abrigava meninas e mulheres adultas, órfãs, pensionistas, devotas, algumas que se estabeleciam temporariamente para guardar a honra enquanto os maridos e pais estavam ausentes”, conta.
Na época do recolhimento, Macaúbas recebeu figuras ilustres, como as filhas da escrava alforriada Chica da Silva, que vivia com o contratador de diamantes João Fernandes. A casa na qual Chica se hospedava fica ao lado do convento.
Como parte do pagamento do dote das filhas, Fernandes mandou construir, entre 1767 e 1768, a chamada Ala do Serro, com mirante e 10 celas (quartos para as religiosas). Em 1770, o mestre de campo Ignácio Correa Pamplona assinou contrato para construir a ala da direita da sacristia (Retiro), igualmente dividida em celas. A construção tem ainda as alas da Imaculada Conceição, Félix da Costa (a mais antiga) e a de Santa Beatriz, onde se encontra o noviciado do mosteiro.
A construção tem ainda as alas da Imaculada Conceição (16 celas), Félix da Costa (a mais antiga, com 16 celas) e a de Santa Beatriz, onde se encontra o noviciado do mosteiro. Em 1847, o recolhimento passou a funcionar também como colégio, um dos mais tradicionais de Minas. Nas primeiras décadas do século XX, a escola entrou em decadência devido à chegada de congregações religiosas europeias com grande experiência na educação de meninas e por causa da forte gripe de 1919, que matou muitas alunas.
Instalações da construção da Macaúbas. Crédito: Fernando Piancastelli
O colégio foi fechado em 1929, mas o convento por enquanto consegue sobreviver. Ainda hoje, a proposta original de clausura absoluta é mantida. Entrar na clausura é impossível – trata-se de um lugar exclusivo das religiosas, que só saem de Macaúbas em ocasiões especiais: consultas médicas ou odontológicas, eleições, resolver problemas administrativos, participar de reuniões da assembleia da ordem ou fazer cursos de espiritualidade para a vida contemplativa. O contato é apenas verbal e se faz através de uma treliça.
“Para viver aqui é preciso coragem e vocação. É um chamado de Deus. Não estamos isoladas do mundo, mas rezando por ele. No mosteiro há computador e televisão, para vermos noticiários. No entanto, usamos esses recursos com muita cautela”, conta a abadessa.
Para se manter, as freiras vivem da aposentadoria das concepcionistas mais velhas, produzem vinhos de rosas, jabuticaba e uva, fazem doces, quitandas e trabalhos manuais, mantêm a hospedaria na Ala do Retiro e recebem ajuda de benfeitores, como a Missão Central dos Franciscanos, da Alemanha.
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