De 28 cidades da bacia, 21 têm perdas de água acima da média nacional, diz estudo

13/06/2022 - 17:55

O Instituto Trata Brasil, organização da sociedade civil criada em 2007 e especializada em saneamento básico, promoveu estudo sobre perdas de água potável com análises do panorama nacional, regional e das 100 maiores cidades brasileiras.


Outra de suas iniciativas, o Painel Saneamento Brasil traz informações de 834 municípios. No caso da Bacia do Rio das Velhas, com 28 cidades nessa lista, a fotografia que emerge é grave: apenas sete têm taxas inferiores ao índice médio nacional, que já é muito alto, de 37,54%. Os números são do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS) e se referem a 2020.

Jaboticatubas, com perdas da ordem de 27% do total de água disponibilizada para distribuição e serviço operado pela Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa), ostenta o menor patamar, com Itabirito – que tem Serviço Autônomo (SAAE) – em segundo lugar (29,8%). Capim Branco, Confins, Lagoa Santa, Nova União e Taquaraçu completam o clube.

O ranking do desperdício é liderado por Santa Luzia – serviço também a cargo da Copasa –, com 61,8% de água tratada perdida, seguida por Sete Lagoas (SAAE), com 61,2%. Outros oito municípios jogam fora metade ou mais desse recurso essencial.

De acordo com o engenheiro Valter Vilela, que se aposentou na Copasa há quatro anos e representa a Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (ABES) no Comitê de Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas (CBH Rio das Velhas), “a meta da Copasa era reduzir as perdas a 25% desde os tempos do PLANASA [Plano Nacional de Saneamento, instituído pelo governo militar nos anos 1970 e extinto em 1986], mas a Copasa tem hoje média de 40,3%”.

Vilela cita, dos fatores que dificultam o controle, a “priorização dos investimentos em novos sistemas, em detrimento à busca da excelência operacional”, e acrescenta: “Precisamos de um planejamento estratégico com um bom diagnóstico operacional para investir na recuperação dos sistemas de distribuição”.

Chama atenção o caso de Belo Horizonte e seus 43% de perda, pela magnitude do que desaparece em um sistema de abastecimento para mais de 2,5 milhões de habitantes. De acordo com o IBGE, na Pesquisa Nacional de Saneamento Básico 2017, o consumo de água na capital mineira atingia 385.442 m³ por dia. Se aplicarmos sobre esse volume o índice de 2020, teremos mais de 165 mil m³ de perdas diárias, ou 60 bilhões de litros vazando por aí anualmente.

Segundo Vilela, “BH, pela topografia, enfrenta ainda o problema da pressão na rede de distribuição. Não podemos passar de 50 metros de coluna d’água [quando a pressão eleva a água a 50 m de altura] porque isso força as juntas e aí vêm os vazamentos. Tem que instalar válvulas redutoras de pressão. Falta manutenção, realocação de equipamentos e mecanismos de controle setorizados. Sem isso, vamos continuar tendo perdas”.


Segundo especialista, topografia de BH e falta de manutenção da rede de distribuição são fatores que também ajudam a explicar perdas


Buraco sem fundo

A situação é ruim no país todo. A média nacional do chamado IN013 – Índice de Perdas no Faturamento – em 2020, de 37,54%, está mais de 20 pontos percentuais acima da taxa dos países desenvolvidos, e maior até do que o valor dos países em desenvolvimento (35%).

Minas Gerais é o 11º estado em perdas de faturamento (38,01%) e o 10º em perdas na distribuição (37,52%). Uberlândia, na bacia do Rio Araguari, é o único município mineiro dos 100 mais populosos do país a figurar entre os 20 com menor índice de perdas.

Somente oito desses 100 municípios atendem hoje às metas da Portaria nº 490/2021, do Ministério do Desenvolvimento Regional, que estabelece uma rota descendente em perdas totais de água, partindo de 100% da média nacional no biênio 21/22; 95% em 23/24 e assim sucessivamente até o índice de 65% da média atual a partir de 2034 (perda de 24,4%).

Outra informação preocupante revela que os extravios, ao invés de sofrerem redução, vêm aumentando ao longo do tempo. Na Região Sudeste, uma das mais bem equipadas do país em serviços de saneamento, a água tratada que sumiu antes de chegar às torneiras de residências e empresas alcançava 34,73% do total distribuído em 2016 e pulou para 38,09% em 2020.

O drama vai mais longe: segundo o estudo do Trata Brasil, a maior parte das empresas do ramo não mede as perdas de água de modo consistente nem adota mecanismos de auditoria independente para aferir a quantidade de água que lhe foge pelos canos.


Monitoramento de vazamentos e manutenção na rede de distribuição são fatores fundamentais para o controle de perdas 


Alto custo

Esse sumiço de recursos hídricos decorre de causas diversas, como vazamentos, erros de medição e consumos não autorizados nem faturados. Os impactos negativos recaem sobre o meio ambiente, a receita e os custos de produção das empresas do setor, onerando todo o sistema, cujo último elo da cadeia é o bolso dos usuários.

As perdas aparentes, ou comerciais, correspondem ao volume de água consumido, mas não autorizado ou faturado, graças a erros de medição ou leitura, ligações clandestinas, falhas de cadastro comercial e outros motivos. Seu resultado imediato é a redução da capacidade financeira dos prestadores e, ato contínuo, de recursos para ampliar a oferta, melhorar a qualidade dos serviços e caprichar na manutenção. O efeito seguinte é o repasse para a tarifa.

Já as perdas reais, devidas a vazamentos em adutoras, redes, ramais, conexões, reservatórios e outras unidades operacionais do sistema, aumentam o custo de produção e desperdiçam recursos hídricos, requerendo novos mananciais. Mais uma vez, a história acaba no (e com o) consumidor.

O estudo mostra que o volume total de água não faturada no ano de referência foi de aproximadamente 7,2 bilhões de m³, mais ou menos o equivalente a 8.000 piscinas olímpicas de água desperdiçadas todo dia. As perdas reais dariam para abastecer cerca de 66 milhões de pessoas durante um ano, o dobro dos brasileiros sem acesso ao abastecimento de água em 2020.

Valter Vilela pontua: “Hoje temos melhores tecnologias, equipamentos que descobrem vazamentos nas tubulações, era para diminuir a perda, mas ela está aumentando e quem paga é o consumidor”. E alerta: “Com o crescimento populacional e tanta perda, daqui a alguns anos nossos sistemas não terão mais água para atender a população”.


Assessoria de Comunicação do CBH Rio das Velhas:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
Texto: Paulo Barcala
Fotos: Michelle Parron; Leo Boi; Bianca Aun