Em Plenária, Comitê discute enchentes, situação das barragens de mineração e outorga para tratamento de fundo de vale

07/02/2022 - 18:15

A 115ª Plenária do Comitê de Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas (CBH Rio das Velhas), realizada na última sexta-feira (04), avaliou o andamento do projeto que vai financiar estudos sobre as manchas de inundação nos municípios da bacia.


Poliana Valgas, presidenta do Comitê, ressaltou que “esses processos de inundação têm acontecido com muita recorrência, em intervalos cada vez mais curtos e em proporção muito maior”, e exemplificou com as cheias de janeiro que devastaram municípios como Raposos, Rio Acima, Nova Lima e Jequitibá. “O CBH vê com muita preocupação esses acontecimentos e estará ao lado dos municípios”, frisou.

Marcus Vinícius Polignano, secretário do CBH Rio das Velhas, disse que o “momento é de solidariedade às pessoas atingidas e a suas perdas”, e destacou que “os mais pobres são os que mais sofrem”. Polignano considera que não há motivo para a repetição dessas cenas chocantes. “Qualquer um que liga a TV hoje tem a previsão do tempo para as próximas semanas, com quantidade de chuvas e tudo o mais. Ninguém é pego de surpresa. Precisamos passar da gestão de crise para a gestão de risco, com um plano mais amplo e propostas de curto, médio e longo prazo para a adoção das medidas necessárias”.

O secretário informou que será contratado um estudo sobre as manchas de inundação do rio a fim de nortear políticas públicas e direcionar responsabilidades das prefeituras, governo do estado e sociedade, lidando assim com as mudanças climáticas e a gestão hídrica. “Não vamos salvar o mundo nem entrar nas competências de cada um; é um plano orientador, de ordenamento. Vamos dialogar, sugerir. O CBH não vai ficar passivo assistindo. Um documento oficial ganha força e ninguém vai poder fingir que não tem problema”.

Finalizando esse debate, o secretário requereu o agendamento de reunião com as mineradoras face à montanha de sedimentos que chegou às cidades. “É preciso uma ação pactuada para amenizar os problemas, todos sentarem à mesa e achar soluções e caminhos”.


Assista ao vídeo sobre as cheias do Rio das Velhas de 2022, também exibido na Plenária: 


Barragens

O conselheiro Valter Vilela Cunha, coordenador do Grupo de Trabalho que acompanha a situação das barragens de mineração no Alto Rio das Velhas e representante da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (ABES), apresentou os resultados da nona reunião do GT, realizada em 1º de fevereiro, com foco nas estruturas que se encontram em nível 3 de risco, o grau máximo, todas de propriedade da mineradora Vale.

Ronald Guerra, o Roninho, mencionou a ECJ (Estruturas de Contenção a Jusante) de Forquilha, complexo de barragens na divisa dos municípios de Ouro Preto e Itabirito, onde “o sistema travou e não fomos comunicados adequadamente”. Para ele, “o GT Barragens precisa buscar informações dos motivos desse mau funcionamento”. Guerra pediu ainda avaliação dos “danos reais da Vallourec (deslizamento, na Mina Pau Branco, de pilha de rejeitos, provocando inundação de trecho da BR 040) e o que aconteceu com a qualidade da água do Velhas”.

Nelson Guimarães, da Copasa, comunicou que o ocorrido não comprometeu o abastecimento e prometeu dados sobre a qualidade da água para esta semana.

Ainda sobre as ECJs, Polignano referiu-se à inundação de estrada no distrito nova-limense de Macacos e salientou que “não era para aquela estrutura barrar água, o que comprometeu ainda mais a população local”. Mauro Lobo de Resende, representante do Sindicato da Indústria Mineral do Estado de Minas Gerais (SINDIEXTRA), detalhou que “a estrutura permite vazão contínua, mas fecha imediatamente em caso de emergência, o que aconteceu quando foi atingida a cota de enchimento”. Segundo ele, toda “essa água chegaria a Honório Bicalho [também distrito de Nova Lima], que já enfrentava cheia violenta”.

Polignano alertou que esta contenção das águas trouxe sérias consequências para as comunidades locais, inclusive impedindo o trânsito de pessoas.

Nádja Murta Apolinário, da Prefeitura de Ouro Preto, defendeu que “resolver só a questão das barragens não resolve o problema minerário. Passou da hora de pensar e rever. É preciso tomar para si uma responsabilidade muito séria que é a vida das pessoas”, referindo ao setor minerário. Concordando, Polignano realçou que “são todas as estruturas minerárias, não só as barragens. A Vallourec não estava no radar, mas uma pilha de estéril não desmonta da noite paro o dia. O modelo de fiscalização é muito capenga, não dá segurança para ninguém, nem para as próprias mineradoras. Esse é um debate que temos que avançar com a mineração e com a sociedade. Passou da hora de repensar tudo isso”.

Aprovado tratamento de fundo de Vale que respeita trecho em leito aberto

A Plenária referendou a intervenção da Sudecap (Superintendência de Desenvolvimento da Capital) no córrego Marimbondo, afluente do Ribeirão Onça, em Belo Horizonte, condicionada a ações de preservação e educação ambiental. A deliberação pode estabelecer um marco nas outorgas dessa natureza.

As obras autorizadas incluem a implantação de interceptor de esgoto, em que parte do córrego ficará com canal em gabião para permitir a comunicação do curso d’água com lençol freático e de faixa de servidão destinada às manutenções promovidas pela Copasa, uma vez que existem construções dentro do leito do córrego. Na avaliação do secretário do CBH Rio das Velhas, Marcus Vinícius Polignano, “o que entrou aqui com muita polêmica serviu para um amplo debate coletivo”.

De acordo com Polignano, “não podemos aumentar a velocidade das águas, ainda mais na região da Vilarinho [avenida em Venda Nova, Belo Horizonte, repetidamente inundada]. Num fundo de vale muito íngreme, com árvores de mais de 10 metros de altura e cachoeira com poço que funciona como bacia de retenção natural, não há por que desmontar tudo isso para colocar uma estrutura de concreto”, destaca o secretário, saudando a preservação da área e o início do tratamento do esgoto de cerca de 10 mil moradores vizinhos do curso d’água. “Esse é o melhor cenário. Nossas recomendações estão contempladas”.

Polignano se refere às três recomendações que acompanham a outorga: desenvolvimento de projeto de educação ambiental dirigido às comunidades do entorno, manutenção em leito natural do trecho encachoeirado com ampla mata ciliar e cercamento da área onde ocorre o processo de revegetação natural.


115ª Plenária, realizada de forma virtual, foi também a primeira do ano para o CBH Rio das Velhas


Para melhor prosseguir

Na esteira desse debate, diversos membros do CBH Rio das Velhas se manifestaram sobre processos de outorga que chegam à Câmara Técnica de Outorga e Cobrança (CTOC) depois de iniciadas ou até mesmo concluídas as obras para as quais se requer autorização. Para Eric Machado, representante da Prefeitura de Contagem, “o trâmite tem que ser mais respeitoso com os conselheiros”. Cecília Rute de Andrade Silva, do Movimento CONVIVERDE, clama contra “processos de 10, 15 anos que chegam pra gente analisar”.

Rodrigo Lemos, membro da CTOC e representante da Associação Promutuca, relatou os inúmeros “problemas que dificultam os trabalhos da Câmara Técnica” para analisar em prazos exíguos “processos às vezes extraordinariamente complexos”. De acordo com Lemos, “são muitos processos irregulares, funcionando sem outorga prévia do CBH”. Para ele, diversas perguntas precisam ser respondidas para que os trabalhos da CTOC e do próprio CBH sejam desenvolvidos na normalidade, como “notificação de infrações, punições e responsabilização e a existência de irregularidades no ato administrativo de concessão de licença ambiental e intervenção hídrica sem outorga prévia do Comitê de Bacia Hidrográfica”.

José Procópio de Castro, da Associação de Desenvolvimento de Artes e Ofícios (ADAO) comemorou: “Até que enfim estamos tomando esse rumo. Não se aprova nada de 10 anos atrás, com obra concluída ou iniciada, uma questão recorrente. Aí tem responsabilidade do órgão gestor das águas no estado”. Vários conselheiros se manifestam na mesma linha.

Como encaminhamentos para normatizar o procedimento, serão agendadas duas reuniões: a primeira, entre a Câmara Técnica Institucional e Legal (CTIL) e CTOC para analisar procedimentos e solicitar manifestação técnica da Agência Peixe Vivo (APV); a segunda, envolvendo a diretoria ampliada do CBH Rio das Velhas, a CTOC e o Instituto Mineiro de Gestão das Águas (IGAM). Uma moção consubstanciando a posição do CBH será redigida e levada para aprovação da próxima plenária.

Outros assuntos

Thiago Campos, gerente de projetos da Agência Peixe Vivo, anunciou a contratação, após processo licitatório, da empresa HidroBR para atualizar a metodologia de cobrança pelo uso de recursos hídricos, ação necessária em razão da Deliberação 68/2021, do Conselho Estadual de Recursos Hídricos.

Campos tratou também do Grupo de Acompanhamento Técnico (GAT) para auxiliar nessa empreitada, integrado de forma paritária por representantes dos segmentos (sociedade civil, poder público e usuários). Para Polignano, a inciativa é mais do que necessária em virtude de várias “distorções”: “Quem mais paga é o usuário final, porque o custo é repassado. Temos que ponderar e valorar de modo mais adequado”.

Foi apresentado também balanço do Plano de Investimentos 2021, com 40 ações, disponível no link https://cbhvelhas.org.br/contrato-de-gestao/atualizacao-do-ppa/.

Homenagens

Logo na abertura dos trabalhos, a plenária prestou homenagem ao conselheiro Marco Aurélio Andrade Corrêa, falecido recentemente. “Um grande companheiro”, lembrou a presidenta do CBH, Poliana Valgas, que solicitou um minuto de silêncio em sua memória. O secretário Marcus Vinícius Polignano emendou: “Muito respeitoso, um democrata mesmo na divergência. Contundente, mas, acima de tudo, leal”.

Ao término da plenária, Derza Nogueira, da equipe de Mobilização, anunciou seu desligamento do CBH e recebeu inúmeras manifestações de carinho e admiração pelo trabalho ao longo de mais de 20 anos. “Passei por cada pedacinho da Bacia do Velhas, por cada Subcomitê, uma bagagem que a gente carrega e não esquece mais”, declarou.

 

Assessoria de Comunicação CBH Rio das Velhas:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
Texto: Paulo Barcala
Fotos: Paulo Barcala