Revista Velhas nº 19: Experiência de comunidade, o vilarejo de Extrema

08/08/2024 - 10:00

Estratégia de turismo chama protagonismo para a comunidade sustentável em região da bacia do Velhas


Mesmo não sendo um hino oficial do estado, a canção “Ó Minas Gerais”, cuja melodia é uma adaptação direta da música “Vieni Sul Mar”, já entoava o sentimento que é compartilhado pela maioria dos mineiros e visitantes: “Quem te conhece, não esquece jamais”. Não à toa, o vilarejo rural de Extrema, distrito de Congonhas do Norte, se consolida como excelente destino para se visitar no Médio-Baixo Rio das Velhas. A região vem atraindo as pessoas ao priorizar o Turismo de Base Comunitária (TBC) e proporcionar experiências que evidenciam as belezas naturais e a vivência com a comunidade, marcando a memória de quem passa por lá.

Localizado a 206 km da capital mineira, Belo Horizonte, e a 13,5 km de Congonhas do Norte, o vilarejo de Extrema é um exemplo do TBC para a bacia do Rio das Velhas. Diferente do modelo tradicional e os segmentos de turismo, como o cultural, rural, o de natureza e social, o Turismo de Base Comunitária é uma estratégia de gestão social e empreendedorismo que vem ganhando força dentro do segmento, permitindo vivências que a própria comunidade organizou para aquele determinado tempo.

O sentimento e senso de coletividade é algo que pode ser alcançado no local por meio desse tipo de turismo. A moradora do vilarejo, Rita de Cássia Silva, é categórica em suas palavras. “Tem que vir para viver a experiência de comunidade, a experiência de Extrema”.

Imagine desfrutar de uma gastronomia, de técnicas e histórias, passeios guiados por moradores e de uma estalagem que foi pensada, organizada e executada por toda a comunidade? Isso é o TBC. Portanto, essa estratégia tem como objetivo promover um turismo mais justo, que coloque a população local no protagonismo em todas as etapas de elaboração, execução e resultados – e claro, levando em consideração a sustentabilidade social e ambiental das atividades.

Essa estratégia “nasceu da necessidade das comunidades se emanciparem socialmente neste cenário de turismo, já que muitas vivenciam a chegada do segmento, mas não conseguem participar das tomadas de decisões e do planejamento, e acabam recebendo apenas os impactos, tanto os positivos quanto os negativos”, explica Luciana Priscila do Carmo, Turismóloga e Mestra em Geografia.

Em Extrema, a alta procura de locais dentro ou próximo ao Parque Estadual da Serra Geral do Intendente, no distrito de Tabuleiro, em Conceição do Mato Dentro, principalmente durante a pandemia de Covid-19, fez com que a comunidade se organizasse e tomasse para si as rédeas do tipo de turismo na região.

Para além da organização comunitária, o TBC é um exercício de economia criativa e educação ambiental para os turistas, já que o ambiente físico e biótico, como a vila e as cachoeiras, é o diferencial do destino. “O turista vai usufruir do que há de melhor, que são as pessoas, o meio social de quem vive e cuida da bacia”, completou a turismóloga.

No coração do Espinhaço, vilarejo recebeu o nome de Extrema por estar nos limite entre as bacias dos rios São Francisco (Rio das Velhas) e Doce (Rio Santo Antônio).

O Ecovilarejo de Extrema

O vilarejo rural está situado na Cordilheira do Espinhaço, no limite entre as bacias dos Rios São Francisco (Rio das Velhas) e Doce (Rio Santo Antônio) – daí o nome Extrema. A fundação do vilarejo está ligada ao Senhor Joaquim Candeia, um curandeiro que foi conhecido e reconhecido por toda a região pelos seus processos de cura realizados com as plantas da cordilheira. Durante anos, a região foi o seu lar, até a chegada de novos moradores e famílias durante o século passado.

Atualmente, com aproximadamente 40 casas e 240 habitantes, Extrema é denominada como um ecovilarejo rural, por conta de sua atividade econômica e sistemas de fossas ecológicas, e mantém parte de suas construções originais, mesmo que algumas outras já tenham modificações mais contemporâneas.

O Espaço Educacional Contraponto, idealizado pela bióloga e educadora Alessandra Calvão, foi um pilar para a instalação do TBC na região, com iniciativas como a permacultura e a agroecologia buscando desenvolver a autonomia e o empoderamento dos moradores locais. “Houve essa troca com a comunidade desde o início. Então aprendemos com os moradores (…) e, hoje, buscamos atrair esses turistas, que venham e fiquem para aprender técnicas e costumes”, reforçou Calvão.

Após ouvir demandas e estruturar oficinas, o Espaço Educacional Contraponto realizou cadastros de atrativos naturais e históricos da região, e de prestadores de serviços turísticos, para, assim, realizar capacitações de gestão financeira, de hospedagem e alimentação, guias turísticos e outros, para a população.

O vilarejo hoje conta com trilhas ecológicas estruturadas, placas indicativas, pacotes de experiências para turistas, outdoor e distribuição de panfletos em Congonhas do Norte e região, uma feirinha de produtos rurais, área de camping, uma estalagem e guias locais.

           

Diante da estruturação do TBC, uma outra organização comunitária ganhou força: o Coletivo de Mulheres de Extrema. A educadora e participante do coletivo Beatriz Gama contou que o movimento começou em 2020 com o objetivo de trocar saberes e gerar renda para a comunidade. Durante esse período, oficinas em diversas áreas foram realizadas para que todas pudessem conhecer e se identificar com alguma técnica. “Tivemos um curso sobre placas entalhadas e móveis de bambu, e essa foi uma das técnicas que elas mais se identificaram, tanto que hoje é o que elas mais produzem”, explicou Gama.

Para além do aprendizado manual, Beatriz afirma que a grande felicidade para ela é ver o fortalecimento de laços, já que “elas passaram a se encontrar muitos dias além do que a gente combinou e isso não ocorria antes. (…) Acho que esse movimento coletivo em si pode ser uma tecnologia social também”.

A moradora Kátia Souza de Almeida viu o seu trabalho ganhar novo significado após o surgimento do coletivo de mulheres. Segundo ela, “houve muita oportunidade – e ainda há, né? Porque antes do projeto vir para cá e fazer o que a gente faz hoje, ficávamos apenas com o serviço de casa, né? E hoje nós temos um outro trabalho, inclusive mais sustentável”. Kátia explica também que a chegada do coletivo trouxe outras mulheres para a comunidade. “Muitas pessoas já vieram para cá, para conhecer o espaço e o nosso trabalho. (…) Porque antes, a mulher só tinha o serviço de casa”.

Ela vê um futuro promissor para o turismo na comunidade. “Eu vejo para Extrema um futuro grande. Vejo muita coisa que não tinha e hoje tem. É cada oportunidade que nós temos, então vejo esse espaço maior do que ele já é”.


Beatriz Gama destaca que coletivo teve início buscando trocar saberes e gerar renda para a comunidade. Kátia Souza de Almeida viu aumentar oportunidades de trabalho a partir do surgimento do coletivo de mulheres em Extrema.

Prosa e muitas gostosuras

Natural de Santos Dumont, criada em Sete Lagoas e, hoje, moradora do vilarejo de Extrema, Rita de Cássia Silva é uma mulher que abraçou a comunidade em que vive, tanto pela força de trabalho, quanto pela comida. Casada e com uma filha, Rita viu nas receitas de sua mãe e em vídeos do YouTube a oportunidade de cozinhar para quem chega no vilarejo. “Esse negócio de cozinhar e servir comida para as pessoas, eu acho uma responsabilidade muito grande. A princípio, fiquei meio assustada, mas depois eu gostei.”

Rita conta que começou com quitandas, mesas de cafés mineiros que possuem pão de queijo, broas, biscoito de polvilho, rosca, bolo de fubá e outras delícias. O retorno positivo das pessoas passou a incentivá-la a testar outras receitas e pratos. Além de uma cozinheira de mão cheia, Rita recebe em sua casa alguns hóspedes que vêm em busca do Turismo de Base Comunitária. “Claro, não é qualquer pessoa que irei receber, mas é interessante notar que existem pessoas para esse turismo. Teve uma moça que ficou aqui comigo, depois de alguns dias de muita conversa, ela me falou que eu era tipo uma mãe para ela. Ela viveu a experiência de Extrema em comunidade, né?”, contou.

Sobre o TBC, Rita está bem otimista, já que vê o crescimento pela procura do vilarejo. “A gente sempre vê pessoas procurando, né? Pessoas que vêm passar um final de semana. Vemos também que realmente esse é um projeto que veio para ficar, e que bom, fico feliz, que consiga, cada vez mais, se desenvolver respeitando a natureza e a comunidade”.

Com o crescimento do turismo, Rita de Cássia passou a cozinhar e recepcionar hóspedes em Extrema.

Belezas Naturais

Assim como já cantavam os mineiros, “quem te conhece não esquece jamais”, o vilarejo de Extrema e a cachoeira da Fumaça são um desses lugares para ficar na memória. Com três cachoeiras localizadas na comunidade de Extrema, e outras cinco na região, o vilarejo se torna o local perfeito para os turistas que gostam de trilhas e quedas d’águas.

Visitamos a imponente e majestosa Cachoeira da Fumaça. Com uma trilha sinalizada de 25 minutos de caminhada na ida e 40 minutos de volta, a Cachoeira da Fumaça é vista de longe por quem se aventurar por ela. Após atravessar um pequeno curso d’água e seguir por mais alguns metros, a Cachoeira da Fumaça estará logo adiante.

Formada por um extenso paredão de pedras, a cachoeira possui um poço que bate na altura do peito. Curioso notar a disposição das pedras ao fundo deste poço, já que as pedras lisas formam um chão de pedras, quase plano, ao longo de toda a sua extensão.

O acesso a ela é relativamente fácil, pois há trilha e corrimão para apoio durante a descida. Contudo, a volta para o centro do vilarejo pode ser um pouco mais custosa, já que a trilha é bastante íngreme em sua volta. Para conhecer melhor a região, vale conversar com os guias e moradores locais.

Além da Cachoeira da Fumaça, a região possui outras sete cachoeiras de acesso estruturado. São elas a Cachoeira da Cobra, Cachoeira da Samambaia, Cachoeira Chiquinho da Escola, Cachoeira do Carapinas, Cachoeira das Virgens, Cachoeira do Levi e Corredeiras do Cedro.

Atmosfera bucólica e belezas naturais preservadas encantam viajantes que vão a Extrema.


 

Quer saber mais sobre a experiência em Extrema e outras iniciativas de TBC na bacia? Assista novamente o webinário promovido pelo CBH Rio das Velhas: bit.ly/WebinarioTBC

 


 

Assessoria de Comunicação do CBH Rio das Velhas:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
Texto e fotos: João Alves