Subcomitê Ribeirão Arrudas discute obras e Bacia de Detenção no Cercadinho

28/06/2022 - 12:35

O Subcomitê Ribeirão Arrudas, um dos 18 organismos de base do Comitê de Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas (CBH Rio das Velhas), realizou, na quinta-feira (23), sua 133ª reunião, expressivo número que revela a dedicação de conselheiras e conselheiros à causa das águas.


Participação é o forte aqui, com destaque para a multiplicidade de organizações da sociedade civil. Neste encontro, estavam lá representantes da Associação Várzea das Flores, Projeto Manuelzão, SOS Mata do Havaí, Conviverde, Instituto Guaicuy, CREA-MG (Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Minas Gerais), Movimento Cercadinho Vivo e Associação do Estoril, além de moradores de vários outros bairros da região. Poder público, como a Secretaria de Meio Ambiente de Belo Horizonte, e o segmento de usuários, como a Vilma Alimentos, também marcaram presença.

Em pauta, a apresentação, pelo Diretor de Gestão de Águas Urbanas da Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), Ricardo Aroeira, e por sua assessora Úrsula Caputo, do andamento das obras na bacia do Cercadinho, tributária do Ribeirão Arrudas, que objetivam o controle de cheias e envolvem a construção de Bacia de Detenção (BD), solução que suscita polêmica.

Na introdução, Aroeira salientou que Belo Horizonte é pioneira na formulação do Plano Municipal de Saneamento e frisou a importância do controle social e da participação popular na construção dessas políticas.

Durante sua explanação, Caputo detalhou os principais problemas enfrentados na área, como pontos de inundação, processos erosivos, instabilidade das margens, presença de edificações contíguas aos cursos d’água e lançamento de entulhos, resíduos e efluentes domésticos nos cursos d’água.

Ela informou que o índice de coleta, interceptação e tratamento de esgotos atinge 98,5% na bacia, e que a solução para o pequeno volume remanescente está em fase de tratativas com a Copasa (Companhia de Saneamento de Minas Gerais).

Caputo também informou que já foram concluídos o diagnóstico hidrológico e hidráulico e os estudos e projetos da Bacia de Detenção e das intervenções no trecho canalizado do Córrego Cercadinho. Ainda aguardam ordem de serviço o estudo e o respectivo projeto de tratamento de fundo de vale do Cercadinho e de seu principal afluente, o Córrego Ponte Queimada.



Prevenção de inundações

Segundo o diretor de Gestão de Águas Urbanas, “hoje não existem recursos para a execução das obras, mas, com os projetos prontos, estaremos aptos a captar”, razão pela qual ainda “não é possível anunciar prazos”.

Úrsula Caputo elencou os benefícios das Bacias de Detenção, tendo em vista que são recorrentes as inundações no local: “redução da vazão de pico e da velocidade de escoamento a jusante do barramento; aumento do tempo de pico, dando mais prazo às medidas de contigência; redução de inundações ribeirinhas e da instabilidade e erosão das margens; melhoria do escoamento nas travessias (pontes, bueiros etc.) e viabilização da construção de ponte na rua Professor Duque, melhorando a integração da região”, entre outras.

Cecília Rute, conselheira do CBH Rio das Velhas e integrante do Subcomitê Ribeirão Arrudas representando a ONG Conviverde, foi a primeira a questionar a ideia: “de todos os córregos da Bacia do Arrudas, o Cercadinho é o que tem melhor aspecto, não tem esgoto, tem até peixe… Por que não faz uma Bacia de Contenção em lugar da de Detenção, em que a água passa e deixa o lixo?”

Aroeira explicou que, em “ambiente urbano, criar espelho d’água é complexo. Não basta resolver o aporte de esgoto, que não é a única fonte de poluição. Temos a poluição difusa, principalmente no início da chuvas. Com a lavagem do solo, toda sorte de poluentes vai para o curso d’água. Os espelhos d’água exigem tratamento adicional da água armazenada. Na Bacia de Detenção, que só começa a encher na cheia, o barramento permite vazão sem transtorno”.

Pinga-fogo

Carla Magna, moradora do entorno, protestou contra “o maior canteiro de obras aberto pela especulação imobiliária”, em especial na Avenida Engenheiro Carlos Goulart, para onde, em breve, “dizem que vêm mais 5 mil novos moradores”. Segundo ela, “o Ponte Queimada não transborda mais porque foi reflorestado por nós. Acabou a chuva, vai lá ver, a terra está no lugar. É o rio que está falando, não sou eu”. Para Magna, “BH, Minas e o mundo precisam de reflorestamento e de córregos urbanos. Tem que proibir construção ao lado dos cursos d’água, proteger a água e o meio ambiente”.

Aroeira ponderou: “Inundações são fenômenos naturais. O modelo de cidades é que avançou sobre as áreas de inundação. Adensaram, urbanizaram, e nós temos que lidar com a cidade real. A lei hoje diz: a vazão que um novo empreendimento entrega tem que ser a mesma de antes, como se não houvesse a intervenção. A recomposição da mata ciliar, a maximização da área de inundação, esta é a primeira opção estudada. Se não precisar colocar gabião, ótimo!”.

Caputo completa; “Estamos mais alinhados do que o contrário. A cidade chegou perto do córrego e a expansão imobiliária está no auge. As travessias são insuficientes porque a expansão foi equivocada, não previu isso. Áreas irregulares crescem. O Ponte Queimada e o Cercadinho não podem virar avenidas sanitárias, tem que voltar o olhar pro córrego, renaturalizar, revitalizar, fortalecer o córrego”.

Márcia Marques, coordenadora do Subcomitê, representante do Instituto Guaicuy e uma das fundadoras do Cercadinho Vivo, traz mais elementos: “Temos no Cercadinho uma questão muito afetiva, um dos poucos córregos que nos mostram como era a margem direita do Arrudas. Sempre digo que é quase um museu a céu aberto”.

Marques exalta a construção a muitas mãos: “Como não há verba ainda e temos prazo, qual a possibilidade de fazermos uma associação como a do Onça, um parque ciliar construído com a ajuda da comunidade? Podemos pensar algo diferente do tratamento de fundo de vale”. E prossegue: “Vemos liberação de obras em APPs [Áreas de Preservação Permanente]. A Mata do Havaí, que tem o mesmo tamanho da BD e funciona naturalmente como BD, foi desmatada. É um paradoxo. O que a comunidade queria era uma ponte e isso já virou duas passagens e uma BD. Queremos conversar sobre possiblidades e participar da construção”.

Para Aroeira, “a parceria com a comunidade e com o Subcomitê é plenamente possível e onde puder trazer o vale para o mais perto da situação natural, vamos zelar por isso. Firmo o compromisso de trazer as conclusões dos estudos e as propostas de solução. Queremos inclusive discutir isso no Conselho Municipal de Saneamento. O Cercadinho saneado será uma homenagem à memória do Cigano [Antônio Garcia da Silva, ativista das águas e do ambiente, fundador do Núcleo Manuelzão do Cercadinho, falecido em 2019]”.



Debates continuam

Humberto Martins, da Secretaria de Meio Ambiente da Prefeitura de BH, lembra que “se não tivéssemos a cidade, não falaríamos em BDs”, mas prega a recuperação da “mata ciliar em todo o curso do Cercadinho”. “Temos potencial e isso faz uma grande diferença para o ambiente e a população em volta”. Martins aproveita para divulgar as “oficinas sobre resíduos sólidos em cursos d’água, em parceria com Associações Comunitárias, Limpeza Urbana, a fiscalização de cada Regional e pelos menos duas escolas por região”, quando será selecionado um “curso mais problemático para revegetação”. O CBH Rio das Velhas e o Projeto Manuelzão darão apoio na divulgação.

Márcia Marques, agradecendo a presença e a colaboração de todos aos ricos debates, apontou que se tratou de “uma conversa inicial” e que “mês que vem teremos um Webinário sobre Bacias de Detenção, tipos e impactos positivos e negativos”. Marques ressalta que é fundamental “ouvir a comunidade e integrar os municípios com o CBH e os Subcomitês”.


Assessoria de Comunicação do CBH Rio das Velhas:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
Texto: Paulo Barcala
Fotos: Bianca Aun;Paulo Barcala