Eleições 2022 não destacam agenda ambiental

07/10/2022 - 17:45

O tema não recebeu os devidos holofotes eleitorais, apesar da notória crise ambiental e climática e do fato de assuntos como desmatamento, queimadas, garimpo ilegal e similares terem frequentado amiúde as páginas dos jornais, os noticiosos de TV e a cabeça de boa parte dos brasileiros em 2022.


Em âmbito nacional, a Frente Parlamentar Ambientalista, que reúne deputados federais e senadores comprometidos com a preservação, atuará a partir do ano que vem em desvantagem se comparada ao seu extremo oposto, os representantes dos barões do agronegócio no Congresso.

No entanto, a eleição de personalidades como Marina Silva (Rede-SP), ex-ministra do Meio Ambiente de 2003 a 2008, fornece expressão relevante à defesa do setor. Juntamente com a ex-ministra, duas importantes líderes indígenas estreiam em Brasília, as deputadas eleitas Célia Xakriabá (PSOL-MG) e Sônia Guajajara (PSOL-SP), levando para o Congresso o conceito da Mãe Terra e a sensibilidade dos povos originários no trato com a natureza.

Na opinião de Poliana Valgas, presidenta do Comitê de Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas (CBH Rio das Velhas), mesmo com alguns bons nomes eleitos, a preservação do meio ambiente e dos recursos hídricos, mais vital do que nunca diante dos graves riscos ambientais que corremos no Brasil e no mundo, não ocupou o lugar que merece e precisa nas eleições deste ano. “Espero e torço para que os eleitos aos governos e parlamentos abracem essa causa com toda força para que as gerações atuais e futuras possam viver com mais saúde ambiental e qualidade de vida”.

De todo modo, a real correlação de forças no cabo de guerra ambiental será dada pelo resultado no segundo turno, tal o peso da presidência da República na definição de prioridades e no próprio arcabouço de poder. As propostas e o histórico dos dois candidatos que passaram ao round final na disputa pelo Palácio do Planalto são antagônicos. O veredito das urnas em 30 de outubro vai ditar, em grande medida, os rumos da política pública para a área.

Adesão

O site jornalístico Congresso em Foco divulgou a ferramenta digital Farol Verde, que busca oferecer aos eleitores informações sobre as opiniões de candidatos à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal a respeito das pautas de mudança climática, meio ambiente, direitos socioambientais e sustentabilidade, uma iniciativa do Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS).

O Farol Verde monitorou a atuação de 585 candidatos ao Congresso Nacional, 545 à Câmara e 40 ao Senado. Apenas 132 (28%) passariam de ano na disciplina “defesa do meio ambiente”. Segundo os dados da plataforma, os homens (27%) são menos comprometidos com essa agenda do que as mulheres (44%).

Entre os mineiros que preencheram a enquete sobre 12 temas relevantes para as pautas de clima e meio ambiente, segundo o Congresso em Foco, apenas Dandara Tonantzin (PT-MG), foi “aprovada” entre os eleitos para a próxima legislatura federal.

Trajetória

Diversos candidatos, embora não nomeados na mencionada ferramenta, ostentam forte compromisso com a agenda ambiental. É o caso da deputada federal eleita Duda Salabert (PDT), que mantém firme atuação em defesa da Serra do Curral, e do deputado federal reeleito Rogério Correia (PT), membro efetivo da Comissão Extraordinária das Barragens, criada em 2015 pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) logo após o desastre do rompimento da Barragem de Fundão, em Mariana, propriedade da Samarco Mineração.

Outros aspirantes ao Congresso Nacional detêm trajetória estreitamente vinculada à causa, mas não se elegeram, como o professor da Faculdade de Medicina da UFMG, Apolo Heringer Lisboa (PV), idealizador do Projeto Manuelzão e ex-presidente do CBH Rio das Velhas.

No plano estadual, o voto garantiu ao Legislativo manter nomes em defesa do meio ambiente e dos recursos hídricos. É o caso dos reeleitos João Vitor Xavier (Cidadania), com forte atuação no processo que culminou com a aprovação do Projeto Mar de Lama Nunca Mais, convertido na Lei 23.291/19, importante avanço na legislação de segurança das barragens; Beatriz Cerqueira (PT), com tradição no apoio aos atingidos por barragens; Coronel Sandro (PL), autor de Projeto de Lei que eleva os recursos para os Comitês de Bacias Hidrográficas; Ana Paula Siqueira (Rede), autora do Projeto de Lei que amplia os limites da Estação Ecológica de Fechos, uma pauta defendida pelo CBH Rio das Velhas e Subcomitê Águas da Moeda; e Jean Freire (PT), sempre ao lado dos Comitês de Bacia, como na batalha contra o contingenciamento dos recursos da cobrança pelo uso da água pelo governo do estado.


Coronel Sandro, em audiência com 36 Comitês de Bacias Hidrográficas do estado, em 2019


Para Jean Freire, o tema deveria estar muito mais presente na pauta eleitoral, “ainda mais em Minas Gerais, com crimes gravíssimos como em Mariana e Brumadinho, toda essa questão que envolve a Serra do Curral, e, no interior, com a monocultura de eucalipto destruindo nascentes e contaminando até os lençóis freáticos”. Para seu próximo mandato, quer “lutar ainda com mais afinco e recriar na Assembleia a Comissão das Águas” para “para focar essa questão, pois ela é a centralidade”.


Deputado estadual, Jean Freire também na audiência de 2019


Sua colega Ana Paula Siqueira concorda: “O tema não foi tratado com a devida centralidade nesse primeiro turno. O atual governador falou bonito, nas suas propostas, sobre a Serra do Curral, tema que mexeu muito com os mineiros, em especial com os belo-horizontinos, mas na prática trabalha contra a proteção da Serra. Tenta barrar o tombamento e vende para a opinião pública a ideia de que a mineração é a única forma de gerar riqueza no estado”.

A parlamentar garante que vai “manter a presença ativa e combativa na pauta do meio ambiente e da sustentabilidade, intensificando o debate e trabalhando para barrar o que agride nossas serras e águas”.


Ana Paula Siqueira, falando a respeito da preservação e a expansão da Estação Ecológica de Fechos (EEF)durante o III Fórum Ambiental, realizado em 2019


Entre os novatos no parlamento estadual, figura a atual vereadora da capital Bella Gonçalves (PSOL). Próxima dos Subcomitês dos Ribeirões Arrudas e Onça, da discussão das águas urbanas e autora do requerimento que resultou na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre Barragens, da Câmara Municipal de BH. Ela acredita que o assunto meio ambiente “entrou de forma central nas eleições, principalmente após a morte de Bruno e Dom [Bruno Pereira e Dom Phillips, assassinados no Amazonas por garimpeiros ilegais] e a tragédia dos governos Bolsonaro e Zema” na área, mas sente que “as candidaturas majoritárias deveriam ter explorado mais as propostas para o meio ambiente”.


A então vereadora Bella Gonçalves, em coletiva de imprensa realizada em 2019, junto a representantes de subcomitês


Bella Gonçalves promete “um mandato de enfrentamento ao eucalipto que tem avançado sobre o cerrado e à mineração que agora quer avançar sobre o norte de Minas, onde a água já é escassa”. A “recuperação do Rio Doce (duramente atingido pelo rompimento de Fundão)” também está em seus planos de ação, além do “fortalecimento de órgãos independentes de fiscalização e públicos como o Ibama e a Semad”.


Assessoria de Comunicação do CBH Rio das Velhas:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
*Texto: Paulo Barcala
*Fotos: Gabriel Maciel; Leonardo Ramos; Michelle Parron; Robson Oliveira