Revista Velhas nº16: Quem planta e cuida tem água

06/12/2022 - 10:00

Unindo técnicas de manejo e de conservação do solo, proprietários rurais produzem água e ainda podem ser recompensados financeiramente por isso


Hortaliças, legumes, verduras … e água! Além do cultivo tradicional, trabalhadores rurais também podem produzir em suas terras o líquido essencial para o desenvolvimento e para a vida. Em tempos de mudanças climáticas e escassez hídrica a possibilidade soa como esperança.

Produzir água já é realidade para homens e mulheres do campo que conciliam a atividade agropecuária com boas práticas conservacionistas que melhoram o meio ambiente. Eles têm visto a água brotar de novo da terra, nutrir o solo e correr para o rio. Além de contribuir para a segurança hídrica, existe ainda a possibilidade de receber por isso. Você quer saber como isso funciona? Primeiro, é preciso entender como se produz água!

Só há uma maneira de produzir água, que é permitindo que a chuva infiltre no solo para recarregar os aquíferos e aumentar o volume disponível nas bacias. A água quando chega ao solo tem dois processos a seguir: ou infiltra ou escorre pela sua superfície.

Para uma infiltração preponderante, as plantas são a solução, é o que explica o professor e pesquisador de Recursos Hídricos e Ambientais da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Flávio Pimenta. “As plantas contribuem para manter a água no perfil do solo servindo também como proteção ao escoamento superficial. Com isso, a água infiltra no solo, chegando ao lençol freático, recarregando-o e gerando o que chamamos de escoamento de base, ou seja, teremos mais água ‘brotando’ da terra”, afirma.

Projeto do CBH Rio das Velhas na bacia do Ribeirão Carioca foi o pontapé para início do PSA em Itabirito.

Projeto do CBH Rio das Velhas na bacia do Ribeirão Carioca foi o pontapé para início do PSA em Itabirito.

 
É o que acontece na Fazenda Olhos D`Água em Itabirito, na região do Alto Rio das Velhas, propriedade de Elias Costa de Rezende, produtor da Cachaça São Gonçalo do Bação. “Aqui não falta água. Minha propriedade tem 28 hectares, eu trabalho a produção da cachaça em três hectares e o restante é área preservada. Proteger nossas nascentes, as margens de rios e plantar árvore é uma necessidade urgente! Além de diminuir a erosão e evitar o assoreamento, as práticas que auxiliam na produção de água também podem gerar renda. Muitos produtores acreditam que para preservar só temos gastos. Essa realidade mudou com o Pagamento por Serviços Ambientais [PSA]”, destaca.

Os produtores que recuperam ou protegem os recursos naturais passam a ser remunerados por um serviço até então prestado de forma gratuita. De maneira simplificada, o PSA é um mecanismo financeiro para remunerar produtores rurais, agricultores familiares e assentados pelos serviços ambientais prestados e que geram benefícios para toda a sociedade.

Produtor rural em São Gonçalo do Bação, distrito de Itabirito, Elias Rezende passará a ser remunerado pelos serviços ambientais prestados na proteção de recursos naturais.

Produtor rural em São Gonçalo do Bação, distrito de Itabirito, Elias Rezende passará a ser remunerado pelos serviços ambientais prestados na proteção de recursos naturais.

 

O PSA na bacia do Rio das Velhas

Para incentivar os proprietários rurais na preservação e conservação do solo, visando a produção de água, o CBH Rio das Velhas investiu na capacitação de proprietários rurais para receberem o PSA. A ação é parte de um projeto para recuperação ambiental da bacia do Ribeirão Carioca elaborado pela The Nature Conservancy, em parceria com a Agência Peixe Vivo.

O secretário de Meio Ambiente de Itabirito e coordenador do Subcomitê Rio Itabirito, Frederico Leite, explica que já existem propriedades aptas a receber. “Por meio de um chamamento, recebemos a inscrição de 34 produtores rurais para participarem da capacitação do PSA. Destes, 10 já estão aptos a receber. Por meio do decreto nº 3.523/2021 que dispõe sobre a Política Municipal de Pagamento por Serviços Ambientais e institui o Programa Municipal de Pagamento por Serviços Ambientais (PMPSA) regulamentamos a iniciativa em Itabirito e a expectativa é que o primeiro pagamento ocorra ainda em 2022”, explica.

O PSA é um instrumento econômico que busca recompensar aqueles que utilizam boas práticas em suas propriedades que beneficiam a natureza. O proprietário rural que participa do programa – de forma voluntária – é um agente protagonista para a conservação da água para uso próprio, mas também para um benefício público.

O gerente da TNC, Samuel Barrêto, explica também que a bacia do Ribeirão Carioca, na região de Itabirito, é estratégica para a produção de água. “A região é reconhecida pela sua relevância na produção de água devido às suas características geográficas e hidrogeológicas”, afirma.

O município de Itabirito está cercado de um lado pela Serra da Moeda; tem a Serra das Serrinhas ao centro e do outro lado, as Serras do Gandarela e de Capanema. O Ribeirão Carioca escoa suas águas para o Rio Itabirito, que por sua vez abastece o Rio das Velhas.

Secretário de Meio Ambiente do município, Frederico Leite é também coordenador do Subcomitê Rio Itabirito.

Secretário de Meio Ambiente do município, Frederico Leite é também coordenador do Subcomitê Rio Itabirito.

Quem paga o PSA

A lei nacional ajuda a dar segurança jurídica a diversos arranjos de PSA existentes ou a serem criados no futuro, permitindo que sejam captados recursos de fontes como pessoas físicas ou jurídicas de direito privado e perante as agências multilaterais e bilaterais de cooperação internacional.

Esse novo conjunto de normas prevê também o estabelecimento do Programa Federal de Pagamento por Serviços Ambientais, que poderia atrair muitos recursos nacionais e internacionais. O pagamento ao produtor rural pode ser efetuado de diferentes formas, como repasse direto (monetário ou não), através da prestação de melhorias sociais a comunidades rurais e urbanas, fruto de compensações vinculadas a certificados de redução de emissões por desmatamento e degradação, via comodato, títulos verdes (green bonds) ou Cotas de Reserva Ambiental. Também é possível usar receitas obtidas com a cobrança pelo uso dos recursos hídricos, decisão que compete aos Comitês de Bacias Hidrográficas (CBHs).

Gerente Nacional de Água da TNC Brasil, Samuel Barrêto destaca importância das Soluções Baseadas na Natureza no combate às mudanças climáticas.

Gerente Nacional de Água da TNC Brasil, Samuel Barrêto destaca importância das Soluções Baseadas na Natureza no combate às mudanças climáticas.

 

Água X Clima

O clima é outro fator que influencia a produção de água. O ciclo da água está diretamente ligado ao clima. Assim, mudanças no clima que alterem o regime de chuvas podem provocar o aumento da ocorrência de eventos hidrológicos extremos, como inundações e longos períodos de seca.

O gerente nacional de água da The Nature Conservancy (TNC Brasil), – organização internacional sem fins lucrativos, líder na conservação da biodiversidade e do meio ambiente, Samuel Barrêto, explica que em “um cenário de aumento na intensidade das chuvas em bacias hidrográficas degradadas, por exemplo, haverá um maior pico de inundação com maior escoamento superficial e menor infiltração de água para a recarga dos aquíferos”, esclareceu.

Samuel afirma, ainda, que não podemos renunciar as Soluções Baseadas na Natureza (SbN), pois estudos mostram que elas podem fornecer 37% da resposta no combate às mudanças climáticas para limitar o aquecimento global a menos de 2°C. “As SbN também oferecem um mecanismo para melhorar os ecossistemas degradados, incluindo os sistemas de água doce, levando à melhoria da qualidade e quantidade da água, ao sequestro de carbono e biodiversidade, entre muitos outros benefícios”, explanou.

As SbN consistem na reprodução e/ou reconstrução de recursos naturais para reduzir impactos ambientais e socioeconômicos das atividades humanas no planeta.
 

Conservação e Produção de Água

Outra iniciativa do CBH Rio das Velhas para a aumentar a quantidade de água é o Programa de Conservação e Produção de Água. Lançado em 2021 e com a previsão de duração de seis anos, a iniciativa consiste no desenvolvimento e na execução de ações com o objetivo de maximizar o potencial de produção de água nas sub-bacias hidrográficas, a partir do planejamento e execução de Soluções baseadas na Natureza.

Quatro microbacias foram selecionadas para a execução do programa: Ribeirão Maracujá, no Alto Rio das Velhas; Ribeirão Ribeiro Bonito, no Médio-Alto; Córrego Soberbo, no Médio-Baixo; e Córrego Pedras Grandes, no Baixo Rio das Velhas.

No primeiro semestre de 2022, o CBH Rio das Velhas deu início às ações do programa com o objetivo de maximizar o potencial de produção de água de sub-bacias hidrográficas, trocando as intervenções pontuais por iniciativas mais condensadas e menos pulverizadas. Ainda no segundo semestre deste ano, a expectativa é de estender o programa para outras microbacias.

Infográfico da produção de água

 


Assessoria de Comunicação CBH Rio das Velhas:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
Texto: Luiza Baggio